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MOSAICO – 5º EPISÓDIO – Quem sabe isso quer dizer amor

Como um segredo que se quer revelar aos poucos, foi tirando lentamente o capacete com uma vontade de respirar a si mesmo. Olhou por um instante ao redor enquanto afagava seu cabelo amassado. Estava de volta. Estava de volta à cidade que havia abandonado pra nunca mais voltar e estava de volta ao bar em que havia começado a trabalhar como motoboy no dia anterior. Não contou a ninguém que havia voltado. Queria ficar escondido enquanto recuperava tudo que havia perdido fora dali. O emprego de motoboy no bar era perfeito. Vivia invisível dentro do seu capacete enquanto percorria os quatro cantos da cidade. Era assim que queria, era assim que seria por um tempo. Sentia-se um flaneur às escondidas. Sentado na moto ao lado dos demais entregadores, começou a fitar a todos dentro do bar. De repente, seu coração gelou e um arrepio gelado subiu pelas costas. Imediatamente colocou o capacete, causando um certo estranhamento aos outros entregadores ao redor. Era ela! Ela estava ali. Sozinha na mesa do bar. Ela parecia esperar alguém. Ninguém chegou. Ela bebeu, sorriu, beijou um estranho. Ele foi invadido por memórias e calafrios. Memórias do amor pra vida inteira. Aquele amor que nunca acaba. Vieram as memórias da pele, do cheiro, dos seus corpos ainda mornos e abraçados na manhã seguinte e de tantas outras coisas. Engolia seco e suava frio, ao mesmo tempo em que ainda podia sentir o gosto da sua boca e da textura das suas costas molhadas entre seus dentes. Sentiu um ímpeto de ir até a mesa, mas não foi. Ela levantou-se e saiu cambaleando pelas ruas escuras. Não pensou em nada. Saiu da moto e foi caminhando atrás dela. A situação era quase bizarra e chegou a rir. Afinal, resolveu ir atrás sem tirar o capacete. Mas era assim que tinha que ser. Cuidadosamente se esgueirava pelas calçadas sem ser notado. A não ser quando uma ou outra pessoa resolvia dizer alguma coisa ou brincar com a situação. Afinal, não era comum ver um homem andando escondido pelas ruas só de capacete. Mas ele não ligava pra nada. Enquanto ia atrás dela a sua cabeça revirava. Queria vê-la mais de perto, sentir o seu perfume, olhar no seu olho. A madrugada avançava e nada. Ele a protegia com suas memórias. Memórias que também a levaram para uma praça que ambos sabiam o que significava. Decidido, depois de um tempo, tirou o capacete e arrumou o cabelo. Deu um passo à frente em sua direção. De repente, um telefone começou a tocar. Ela não atendeu. Tomou coragem e tentou de novo. O telefone tocou novamente e ela atendeu. Desligou. Ela olhou ao redor e respirou fundo. O dia estava amanhecendo. Enquanto o dia chegava a coragem dele ia embora. Mesmo assim, tirou o celular do bolso e colocou uma música do Milton que havia cantado pra ela. A música que era “Quem sabe isso quer dizer amor” começou a encher a praça ainda silenciosa e vazia daquela manhã. Ela olhou em volta com um ar surpreso. Quase não acreditava. Procurou instintivamente por ele. Ele já havia colocado o capacete e se afastava junto com a música. Ela ficava com a memória. Ele caminhava, assim como os versos do Milton, com a vontade “… de chegar a tempo de te ver acordar, de vir correndo à frente do sol, de abrir a porta e antes de entrar, reviver uma vida inteira…”

Gil Guzzo –Belo Urbano, é artista, professor e vive carregando água na peneira. É um flaneur catador de latinhas. Faz da rua, das pessoas e da vida nas grandes cidades sua maior inspiração. Trabalha com fotografia de arte, documental e fotojornalismo. É fundador do [O]FOTOGRÁFICO PRESS (Agência de imagens) e professor universitário. Adora cozinhar e ficar olhando distraidamente o mar. É alguém que não se resta a menor dúvida…só não se sabe do que…. 
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MOSAICO – 4º EPISÓDIO – Sinuca

Eu e meus amigos frequentávamos aquele bar assiduamente.

Era um lugar descontraído, onde podíamos nos divertir de diversas maneiras, desde uma boa música ao vivo, uma pista de dança, comidinhas deliciosas, até um vinho de primeira!

Não posso me esquecer da mesa de sinuca, meu lugar favorito, pois ali conhecia muita gente diferente e a interação era uma constante.

E foi dali que rumei ao balcão do bar, pois queria mais uma taça, quando de repente a vi sentada, conversando com um rapaz. Deu para ouvir que falavam algo sobre o Japão, e logo pensei se seria possível ela ter viajado em algum momento para lá. Na verdade, pouco me importava.

Fazia anos que não a via, desde a nossa triste e definitiva discussão. Ela foi uma figura importante, mas saiu da minha vida de um jeito ruim, não deixando boas recordações. Preferi esquecer aquela amizade, pois tinha motivos sérios para isso.

Peguei minha bebida e passei por ela, fingindo não vê-la; não sei se ela me viu, sigo com a dúvida.

Nenhuma palavra foi dita, nem tampouco algum gesto foi feito.

Retomei minha sinuca e fiz uma tacada contínua, deixando a equipe adversária embasbacada.

Confiante de que eu era mesmo uma exímia jogadora – claro que isso não passava nem perto da verdade –,  senti uma vontade imensa de dançar. A música sempre teve um poder transformador em mim.

Na pista de dança com meus amigos me senti feliz! As mágoas do passado não tinham vez… Pelo menos não ali, não naquele momento mágico, onde a melodia me envolvia e fazia com que meu corpo e minha alma estivessem livres.

Simara Bussiol Manfrinatti Bittar – Bela Urbana, pedagoga, revisora, escritora e conselheira de direitos humanos. Ama o universo da leitura e escrita. Comida japonesa faz parte dos seus melhores momentos gastronômicos. Aventuras nas alturas são as suas preferidas, mas o melhor são as boas risadas com os filhos, família e amigos.
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MOSAICO – 3º EPISÓDIO – O último bar de muitos que virão

Era um dia desses que a gente não tem o que fazer. Fui eu, mais dois amigos ao bar. Falávamos daquelas coisas do universo que nos rodeia: Corinthians, Hamilton, MMA, Bolsonaros e outros assuntos irrelevantes de fato. Cerveja vinha, cerveja ia e gente começava a ter tédio. Muito tédio.

Lascamos a falar mal de mulheres que tínhamos tido. Várias, citando o nome ou não, eram motivos de risada. Seja pelas manias, pelas fixações, pelo atrevimento e ousadia. Qualquer valor era motivo de crítica apenas pelo riso. Ao final, estávamos a contar piadas das mais preconceituosas que se possa imaginar…

Um de nós, não lembro qual (mas não fui eu, claro), fez o desafio: Duvido que alguém dessa mesa saia daqui com uma mulher. Trato feito! Rodamos o bar a procura de alguma desavisada que caísse no nosso léro. Foda-se o nome, era por honra! Não queria ser motivo de piada no próximo Happy Hour.

Eis que a vi. Uma mulher sozinha, impaciente, meio que aguardando algo. Me pareceu habituê daquele bar, ou das noites solitárias, algo que me identifico, não sei como. Sentei ao lado, puxei papo sobre o Jalapão  (ou Japão, nem me lembro) ou qualquer outro local que nunca pisei, mas que, por curiosidade, havia lido na Wikipedia. E que sorte, ela sabia algo sobre esse local. Ou que azar, não sei. Só sei que o papo rolou.

Mas a coisa foi andando para um lugar estranho. Ela foi ficando distante e eu sem bala na agulha (ou na língua). O clima foi esfriando à medida que percebia o vazio que ambos tinham e a aflição em preenchê-lo era grande, crescia. Por algum motivo, me identificava com ela, e me atraía por seu olhar vago, à espera de algo.  E não me refiro aos amigos que deram cano no bar, mas algo da vida que lhe faltava.

Senti uma vontade de partilhar meus medos e angústias, meus sonhos também, algo que não faço há muito tempo. “Mas basta! Que pensamento fraco, homem! Solta uma cantada e agarra essa mulher! Você está aí para provar o poder de seu falo aos colegas, não?”. Essa era a voz que me trazia ao chão. Ou à lona, não sei.

De fato, em algum momento inesperado ela me beijou. Me beijou como se estivesse à procura de algo dentro de mim. Parece papo de maluco, mas senti que ela estava em busca de alguma coisa que não iria encontrar em mim. E eu fiquei intrigado com isso, ainda mais que ela se levantou e se foi logo em seguida. Me pareceu que já fizera isso antes, dessa mesma forma. Como se estivesse minerando em busca de uma pedra preciosa que perdera…

Logo parei para terminar meu copo, e nisso, pensei em mim. O que eu estava fazendo ali, meu Deus? Tentei usar alguém para provar algo para outro alguém. Mas eu mesmo ali não estava… Aliás, quem eu era nessa cena, nesse teatro de farsa? Um saco de batatas, vazio e sujo talvez.

Voltei à mesa com sorriso amarelo. Tinha provado a eles meu potencial, mas por dentro continuava a pensar o quão ridículas aquelas noites estavam se tornando com eles. Precisava mudar meu rumo, mas que rumo tomar, sem que achem que sou frouxo, porra?

Cheguei em casa quase de manhã, pois fiquei rodando a cidade até o sol aparecer. Pensei em todas as mulheres que passaram na minha vida. Casamentos, namoros, noivados, noitadas. O que eu tinha plantado nessa vida além de sêmen? Realmente, acho que não vou colher porra nenhuma desse jeito.

Abri meu guarda-roupas, separei alguns objetos que guardava e não usava mais. Coisas que provavam o que eu não era. Separei roupas que não mais cabiam, perfumes da moda e remédios azuis. Botei num saco preto e joguei no lixo. Não sei o que me deu, mas aquele dia, depois daquele beijo vazio, me deu uma vontade de mudar algo que ainda não sei o quê. Preciso começar…

Crido Santos – Belo urbano, designer e professor. Acredita que o saber e o sorriso são como um mel mágico que se multiplica ao se dividir, que adoça os sentidos e a vida. Adora a liberdade, a amizade, a gentileza, as viagens, os sabores, a música e o novo. Autor do blog Os Piores Poemas do Mundo e co-autor do livro O Corrosivo Coletivo.
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MOSAICO – 2º EPISÓDIO – A mesa ao lado

Olhava pela janela esperando que escurecesse rápido para sair. Gostava pouco de ser vista durante o dia, nos tempos que vivia agora. Se arrumara de forma descuidada e seguia, o caminho sabia ‘de cór’.

Entrou no bar vazio pela hora, cedo ainda, pediu uma cerveja. Não se dava conta de quando isso tinha virado rotina. Porém, aquela noite se deparou com uma já imaginada e mais ou menos esperada: encontrar quem tanto brincara com seus sentimentos, todo sorriso e sedução, numa mesa próxima.

Sua companhia tinha o olhar distante enquanto ele não parava de falar. De onde ela estava ele pouco podia vê-la , porém, ela via com clareza que tinha chegado ao fim essa história que um dia mexeu tanto com os dois.

Agora, distante de emoções, olhava-o como um qualquer, ou melhor, aquele homem ela não olharia caso cruzasse o seu caminho.

Ela se distraía com o celular e vez por outra dava uma espiada para o lado, apenas força de hábito.

Naquela noite, naquela hora tomara a decisão que já devia ter tomado há tempos: perder de vez qualquer esperança de um retorno feliz e seguir em frente.

Voltar para casa, não sem antes cruzar pela mesa ao lado, onde ele estava, se fazer vista e jurar para si que não mais se sentiria assim.

 Nove da noite, calor no quarto desarrumado. Entre revistas, livros e roupas espalhadas resolveu ali começar sua revolução pessoal.

Desapego foi a primeira palavra que veio à mente, e partiu para a ação. Juntou tudo que não vestira por um ano, guardou fotos que nada lhe diziam no momento. Juntou livros e revistas para doar, o quarto começava a respirar novos ares.

Refez a cama com roupas limpas. Pôs uma mala sobre ela e começou a colocar roupas escolhidas com carinho, suspirava, sorria. As roupas escolhidas não seguiam uma lógica, não importando sol, chuva, frio, calor.

 O próximo passo foi cuidar das plantas, colocando-as num canto da varanda entre sol e sombra. Passou vistas na sala e cozinha tentando deixar registro na memória da posição de móveis, quadros e objetos.

Já tarde entrou num chuveiro de água bem quente e deixou que lágrimas caíssem junto com a água. Por fim, um jato de água fria! Colocou uma camiseta velha, larga como gostava de dormir e no conforto da cama limpa começou a pesquisar um lugar para onde ir.

Já viajara muitas vezes na sua cabeça, e assim foi. Seguiu sua intuição, deixou tudo pra trás e foi em busca de novos encontros, desencontros ou talvez um porto seguro.

De certo o que ficara para trás não moveria mais seus passos. Agora era a protagonista da sua própria história!

Maria Nazareth Dias Coelho – Bela Urbana. Jornalista de formação. Mãe e avó. É chef de cozinha e faz diários, escreve crônicas. Divide seu tempo morando um pouco no Brasil e na Escócia. Viaja pra outros lugares quando consigo e sempre com pouca grana e caminhar e limpar os lugares e uma das suas missões.
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MOSAICO – 1º EPISÓDIO – Ligue depois

Ela andava pelas ruas. Era madrugada, estava só.

A noite tinha sido uma sucessão de desencontros. Primeiro com os amigos, o que ela entendeu não foi o que eles entenderam e ela foi parar em outro bar com o mesmo nome.

Gente estranha tinha por lá. Esperou, tomou uma cerveja, nada de chegarem, olhou o relógio, nada ainda, mais uma cerveja. Como era fraca para bebidas, já no final da segunda estava meio zonza, resolveu ir para a terceira, começou a rir de tudo que observava por ali.

Chegou um carinha na sua mesa, com uma dessas cantadas baratas e abobadas, mas como ela estava só, aceitou a cantada e que ele sentasse na mesa. Falaram do Japão, nenhum era japonês, e o lugar mais distante que ela conhecia era bem perto, mas atrevida que era, não se fez de rogada e do Japão falava sem parar e ria, porque quem bebe um pouco além da conta ri.

Lembrou da turma de amigos que nunca chegava. Pensou no celular, mas como de costume, sem bateria. Xingou as velhas gerações por não ter comprado aquele carregador que pode carregar em qualquer lugar, mas sabe como é, grana curta.

O carinha que só falava do Japão lá estava a falar sem parar e aquilo parecia uma boca nervosa que precisa ser calada e acalmada; sem pensar lascou-lhe um beijo. Há dois anos atrás ela jamais faria aquilo, mas agora, as águas rolaram e era só um beijo em uma noite de verão, em um alguém, sabe-se lá quem.

Ele ficou boquiaberto e ela foi embora, deixando a mesa e a conta para ele. Foi embora a pé, rodando aqueles bares, sem celular, cabeça acelerada, fala lenta.

Pensava nele, tinha saudades dele, do beijo dele. Não, não era do carinha de cinco minutos atrás não, aquilo era nada, era do outro, do antigo, do que grudava na sua pele, mas que estava longe, do que tinha a melhor pegada, pele a pele.

E esses amigos onde estão? Cabeça ia, vinha, voltava e vinham risadas, ânsia de vômito. Ela era fraca para beber, ficava engraçada, mas assim na madrugada, sozinha na multidão, com quem podia compartilhar?

Podia passar uma cantada e usar o celular de alguém, mas não adiantaria porque não sabia ‘de cór’ nenhum número. Eram quase três horas da manhã, resolveu andar e ir para a praça perto da faculdade, não tinha combinado de dormir na casa de ninguém, e não queria voltar para a casa da mãe porque garantiu que dormiria na casa das amigas.

Então, foi para a praça esperar o nascer do sol, a vista era linda! Já tinha feito aquilo uma vez com ele (ele de novo nos seus pensamentos), ela ria e tinha vontade de dançar, melhor não, estava zonza mas não totalmente sem juízo, dançar na rua era um sonho de infância, mas sem companhia não teria graça.

Na praça, sentou no mirante. Ela, o céu e um celular que tocou. Sim, tocou um celular que estava perto, ninguém ali, só ela, o céu e o celular.

Não atendeu. Tocou de novo. Atendeu: – Alô, não, não é ela. Não, não é ela que está falando. O quê? Como assim? Não, não sou. Ah, por favor, não sou, ligue depois.

Desligou, esperou e o sol começou a clarear o dia, assim como a mente clareava para seu estado normal.

Adriana Chebabi  – Bela Urbana, idealizadora do blog Belas Urbanas onde faz curadoria dos textos e também escreve. Publicitária. Curiosa por natureza.  Divide seu tempo entre seu trabalho de comunicação e mkt e as diversas funções que toda mulher contemporânea tem que conciliar, especialmente quando tem filhos. É do signo de Leão, ascendente em Virgem e no horóscopo chinês Macaco. Isso explica muita coisa. 
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Um ano depois, o que aprendemos?

Eu gostaria de começar este texto com uma pergunta, mas como a gente ainda não se conhece, considero que essa não é a melhor maneira para começar este texto. Melhor eu me apresentar primeiro: Olá! Eu sou a Geovana Pavanelli, mãe do Vicente, de três anos e meio, esposa do Daniel, Relações Públicas por formação (e paixão) e atualmente atuo como Gerente de Pessoas de uma empresa de tecnologia. Muito Prazer!

Agora que você me conhece um pouco vou direto para a pergunta: O que você estava fazendo em 25 de fevereiro de 2020?

Se você não estava em algum bloquinho (ou qualquer evento em grupo) por aí, curtindo a terça-feira de carnaval, talvez esteja, assim como eu, arrependida por não aproveitar a última oportunidade que tivemos de aglomerar sem medo. Parece que foi ontem, mas há quase um ano, em 26 de fevereiro, estávamos recebendo a notícia do primeiro caso de Coronavírus no Brasil.

E agora eu te convido a uma reflexão… Além do kit básico (distanciamento, máscaras e álcool em gel), o que mais mudou na sua vida de lá para cá? Nós tivemos que nos adaptar a um mundo novo. Profissionalmente falando, as mudanças foram ainda mais intensas, e o trabalho remoto passou a fazer parte (se é que ainda não fazia, como é o meu caso) da realidade de muita gente.

Atuando na área de pessoas, posso garantir que a cultura do trabalho remoto (que é diferente do home office) é o futuro das organizações, principalmente na área de tecnologia. Mesmo muita gente voltando ao trabalho presencial com a flexibilização das medidas de proteção da pandemia, mais de 86% das pessoas preferiram continuar no modelo remoto e 52%  mudariam de trabalho se recebessem uma oferta full remote (pesquisa da Robert Half realizada em 2020). As empresas terão que aceitar esse “novo” modelo de trabalho, principalmente porque, sem ele, em um futuro próximo poderão perder talentos e desmotivar equipes.  

Nesse cenário de pandemia muito se ouviu falar de como as pessoas precisaram se adaptar ao trabalho remoto, mas pouco sobre como as empresas precisam se posicionar e orientar a sua liderança sobre esse novo modelo. Tornar uma empresa remota ou híbrida não é fácil e muito menos automático, exige maturidade do empregador, confiança no time e preparação da liderança.

Se aquele modelo de “chefe” que faz microgerenciamento já estava ultrapassado, e as empresas que viam os seus colaboradores apenas como recursos já estão ficando cada vez menos atraentes, no modelo de trabalho remoto esses posicionamentos simplesmente não funcionam. É responsabilidade das empresas entender esse novo cenário, preparar os seus times para o trabalho remoto ou híbrido, motivar e alinhar todos os colaboradores na busca do mesmo propósito e, principalmente, investir na gestão do trabalho remoto, afinal, ele é completamente diferente do presencial.

E me conta, como foi essa experiência do trabalho remoto para você? A sua empresa estava preparada?

Eu posso responder pela empresa em que eu trabalho: por lá o trabalho remoto foi um processo normal e até que relativamente simples, até porque já fazia parte da nossa cultura, mas vi muitos absurdos sendo relatados por colegas que atuam nos mais diversos segmentos, tais como: empresas que não respeitam horários e acreditam que o trabalho remoto é sinônimo de exaustão obrigatória; que cobram por ambientes 100% silenciosos, quando na verdade é impossível controlar a reforma do vizinho; que não respeitam que você vive em uma casa com outras pessoas (por mais que você zele para evitar interrupções) e dão advertência quando seu filho aparece para pedir para fazer cocô; ou que obrigam mulheres grávidas a trabalhar em ambientes fechados, mesmo quando a atividade é totalmente compatível com a atuação remota.

Há um longo caminho pela frente para que as empresas estejam preparadas para o trabalho remoto ou híbrido, mas a meu ver, elas terão que se adaptar, pelo amor ou pela dor, esse será o futuro.

Já como mãe de uma criança de três anos e meio, nada foi mais desafiador do que exercer o lado maternal e profissional ao mesmo tempo e no mesmo ambiente. É maravilhoso poder estar perto do meu filho por mais tempo; no modelo presencial era impossível almoçar com ele todos os dias. Mas também é doloroso vê-lo mais tempo na televisão do que eu gostaria (e do que é indicado), ouvir ele pedindo minha atenção, quando é impossível parar uma tarefa.

É uma balança difícil de equilibrar: culpa materna x profissionalismo. Eu sigo tentando fazer o meu melhor nos dois lados, mas confesso que dificilmente o dia termina com a balança equilibrada e, na maioria das vezes, um dos lados pesa mais. Como profissional também há um longo caminho pela frente, e eu também tenho que me adaptar (pelo amor ou pela dor), afinal, esse é o meu futuro.

Geovana Capovilla Pavanelli – Bela Urbana. Relações Públicas, especialista em comunicação e recentemente apaixonada pelo universo de gestão de pessoas. Mãe do Vicente, de três anos, que é a minha razão de viver. Sou uma pessoa intensa que ama trabalhar, ama o filho, ama a família, ama os amigos e, principalmente, amo a mim mesma.  

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A MÚSICA FAZ A CABEÇA!

E cabeças pensantes demais e afiliados à hipocrisia, fazem com estupidez as cabeças rolarem, entre o curso da reta, do rumo, da seta e da poesia.

E quando cabeças se envergam diante de letras melodiosas, e as fazem sucumbir nas malhas odiosas, saiam da frente que a pipoca estoura e cada um imerge eletricamente tirando seu abadá durante o frenesi da intolerante discórdia.

E nem é preciso pular em delirante carnaval, que as avenidas diplomáti…camente perfeitas e corretas abolem o abalo da sintonia fatídica e começam a construir, os reencontros vorazes de poetas que nos fazem relembrar, questionar e tratar em súmulas com um “VAR” desenfreado nas pautas bem ritmadas e assimétricas, de acordo em acordes do pleito cênico inquisitivo.

E seguindo a narrativa carnavalesca, vejo-me inquirida sobre a proposta que me implele a responder.

Não, eu nunca fiquei pensando e raciocinando sobre o que cantava durante a alegria do carnaval. E não me machucavam os encontros silábicos da poesia, que hoje se descabelam ao rimar para não cair na rompante demagogia. Ontem, naqueles momentos os olhos febris em sonetos descomplicados, regiam a banda na mesma praça com as negas malucas trazendo no colo o filho bastardo.

E mulatas cadenciavam nos quadris, o rebolado de bundas com carnes reais e Sargentelli é que o diga.

E assim, passei em fases diversas, até chegar no século XX e ter que mudar a trajetória de um gato de dona Chi ca ca, e de um briga de casal debaixo de uma sacada os famigerados cravo e a rosa, e claro que muitas outras poesias, de muitos outros poetas que nos cercam e nos embalaram em palcos, telas, e por aí vamos.

Seguindo essa viagem quando alguns mestres seguem provocando as mentes, e se construindo nas pendências e alegorias pessoais.

Vivemos em estado de trio elétrico…

Joana D’arc de Paula – Bela Urbana, educadora infantil aposentada depois de 42 anos seguidos em uma mesma escola, não consegue aposenta-se da do calor e a da textura do observar a natureza arredor. Neste vai e vem de melodias entre pautas e simetrias, seu único interesse é tocar com seus toques grafitados pela emoção.
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O carnaval em Portugal ontem e hoje

O carnaval em Portugal começou como um período para aproveitar tudo, antes do início da Quaresma, momento de jejum e sacrifícios. Antigamente, a Igreja exercia enorme poder sobre as pessoas e, no período da Quaresma, era proibido música, dança, etc. Logo, foi a própria Igreja Católica que serviu de estímulo para a criação do carnaval em Portugal.

Na época do renascimento, iniciou-se a fase das máscaras e bailes.

Hoje em dia, as festividades carnavalescas são conhecidas por “entrudo”, ou seja, entrada. Preparação para a entrada da Quaresma.

Nunca houve plumas ou mulheres sem roupa no carnaval antigo. Muito pelo contrário, nas aldeias, as pessoas trocavam as roupas. Por exemplo, homens com roupas de mulher e vice-versa.

As ruas ficavam enfeitadas com luzes como no período do Natal.

Em algumas localidades, não passava de brincadeiras e gozações. Em outras freguesias, chegavam a ter carros enfeitados e muita alegria.

Em algumas cidades, há o desfile dos cabeçudos e gigantones. Em Estarreja, temos escolas de samba. Também há freguesias que optam pelo carnaval luso-brasileiro, com participação de brasileiros e desfiles inspirados nos sambódromos. Em Torres Vedras, a farra fica por conta das Matrafonas, homens vestidos de mulher e carros alegóricos. Em vários lugares há sátira à política. Varia muito de um lugar para o outro.

No entanto, não se parece muito com o carnaval brasileiro.

Nas escolas, apenas as crianças mais novas podem usar fantasias. Aos estudantes maiores cabe a tarefa de observar e recordar. Muitas pessoas aproveitam a época para viajar e descansar. Há uma comida típica muito forte apreciada pelos portugueses no dia do carnaval (terça-feira). Trata-se de um cozido com muitas carnes, legumes e verduras.

Apesar de ser diferente, acho que vale a pena conhecer e conferir a diversidade que existe em cada canto do país! Há um calendário próprio com a programação de cada região.

Espero por vocês em carnavais futuros.

Eliane Pacheco Engler – Bela Urbana, luso brasileira, vive em Portugal a quase 7 anos. Fonoaudióloga de formação de coração, mas atualmente o seu maior amor é pela família. Dedicação quase que exclusiva. Tem se aventurado pelo YouTube e pela área imobiliária.
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Esse ano…

Você que acorda cedo pra pular Carnaval. Que vai tarde adentro, noite afora. Que esperou ansioso para camelar ao sol e ao som de batuques. Não vai poder entrar na folia este ano, porém não passará de bar em bar pisando em urina fresca, não vai levar passada de mão gratuita e terá seu dinheiro guardado na pochete no fim do dia.

Brincadeiras à parte, o carnaval foi cancelado! A pandemia não!

Ainda na espera dos blocos vacinados muita gente vai ter que reinventar a passagem sem o batuque horas a fio.

O que faria no carnaval será feito em casa e sem o agravante de ser assaltado ou ferido. Brincadeiras à parte, este texto satírico é só pra deixar mais ameno o fato de que o brasileiro, folião por definição, terá que brincar de pijama mesmo. Do Oiapoque ao Chuí.

Mas não se lamente, ouça um álbum novo, ou velho, faça uma playlist, entretenha-se num podcast, leia um livro engavetado, veja um clássico.

Seu carna vai ser diferente porque todos somos hoje. Não haverá festas, nem manchetes e fuzuê.

Seu amor sambista vai aguardar a vacina chegar.

Fantasia de coronga nem à vista. A gente não aguenta mais ver essa praga.

Não há festa. Nem manchetes dos títulos, alvoroço nas ruas.

Tô fria? Não. Realista.

Cozinhe seu prato preferido, sambe na sala até calejar. O importante é que estaremos vivos para pular feito doido quando o mundo deixar a folia voltar.

E tá tudo bem! O samba é maior! E tá dentro da gente oriundo que só ele, guardado e protegido.

Meg Lovato – Bela Urbana, formada em comunicação social, coreógrafa e mestra de sapateado americano e dança para musicais. Tem dois filhos lindos. É chocolatra e do signo de touro. Não acredita em horóscopo mas sempre da uma olhadela na previsão do tempo.

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Vou falar de infância e carnaval, no ano de 1984

Em relação ao carnaval, nesse ano, o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro passava por grandes mudanças, entre elas a inauguração do Sambódromo na Sapucaí. Já quanto à infância, eu com apenas 11 anos e meus primos com idades entre 6 e 14 anos, não estávamos interessados no principal acontecimento do carnaval do Rio de Janeiro, ou seja, que o samba deixaria de acontecer no asfalto de grandes avenidas e passaria a ter a sua própria casa.

Naquela época, a chegada do feriado do Carnaval era muito esperada pelas famílias que viviam no interior de São Paulo, principalmente pelas crianças. Um feriado prolongado nos dava a possibilidade de viajar e a torcida era para que pudéssemos sempre ir à praia. O que aconteceu por vários anos consecutivos…

Tínhamos um tio muito querido que adora viajar e sempre convidava a família toda… Digo tínhamos porque esse meu tio nos deixou ainda muito jovem, com apenas 35 anos de idade, vítima de um aneurisma cerebral.

Não quero falar de tristeza, porque meu tio era pura alegria, e falar desse ano, especificamente, me faz homenageá-lo ao lembrar de algumas situações engraçadas que vivenciamos na cidade de Itanhaém, município da Baixada Santista, e que ficaram marcadas para sempre.

A aventura começou já na descida ao litoral, pois como íamos em várias pessoas e, naquela época, os lugares para compras de alimentos eram escassos, tínhamos que levar muita comida para dar conta da fome do povo todo, e para ter espaço para outras coisas que levávamos, meu tio acoplava ao carro uma carretinha.

Saímos de casa de madrugada, e quando estávamos na Marginal Pinheiros, um dos pneus da carretinha se soltou e correu na estrada. Eram só crianças gritando e adultos correndo em direção ao local da parada do pneu. Graças a Deus, a pista estava tranquila (acredito que pelo fato de estar muito cedo) e nenhum acidente foi provocado.

Euforia total nos carros, começava ali o nosso carnaval… muitas risadas, gritos e correria para sairmos da pista o mais rápido possível.

Ao chegarmos na praia, outra situação atípica… Como era a primeira vez que meu tio tinha alugado aquela casa, estávamos acostumados a ir em outro imóvel, demoramos um pouco para encontrá-la. O lugar era distante e com poucas construções, o que deixava o local um pouco sombrio. Os adultos, imediatamente, começaram a comentar o quão difícil ia ser sair dali para ir ver o carnaval de rua, e as crianças mais velhas começaram a falar dos perigos da noite para os pequenos. Muitas risadas e choros.

Meu tio quis alugar uma casa maior para acomodar melhor a família toda, mas também queria nos fazer uma surpresa: na casa tinha piscina com escorregador, o que era uma novidade para todos e acabou causando muito contentamento, principalmente para as crianças, e os choros de minutos atrás se transformaram em muita alegria e euforia.

Durante os dias, as crianças ficavam divididas entre ir à praia ou ficar na piscina. E o carnaval de rua durante a noite? Ah, esta é outra história!

Vou contar aqui o que aconteceu em um dos dias, com duas situações engraçadíssimas…

A família toda foi assistir ao desfile de rua e, chegando lá, havia um público bastante animado. Pessoas desfilando em trajes engraçados e uma considerada plateia acompanhando, dançando, cantando… até que em certo momento, um grupo que estava desfilando começou a jogar no público algumas coisas, o que me lembro eram casca de banana, tomate, farinha, fubá, ovos, entre outros. Minha família toda aglomerada, isso em 1984, certo? Não sabia o que fazer.

Os adultos queriam correr, mas tinham as crianças que para enxergar melhor estavam um pouco distanciadas. Como era carnaval, o público entrou na brincadeira e não era mais possível saber de onde vinham as coisas que estavam sendo atiradas. 

O carnaval acabou cedo para a minha família, tivemos que voltar para casa porque muitos foram atingidos naquela brincadeira, até ovos estavam espalhados pelas roupas. Chegando em casa, foi aquela correria para o banheiro, os atingidos queriam se livrar das roupas e tomar banho.

Lembro que uma das minhas tias teve a ideia de ir usar o banheiro de fora da casa, que era um pouco afastado, e algumas crianças, inclusive eu, resolvemos ir com ela. Afinal, aquele seria um local mais tranquilo, uma vez que a casa estava bastante agitada.

Minha tia entrou correndo porque estava com vontade de fazer “xixi”, mas ela mal entrou e começou a gritar desesperadamente. Nós, crianças, não sabíamos o que fazer e fomos chamar os adultos da casa. Depois de algum tempo, minha tia abriu a porta e mostrou a perereca que se encontrava em um canto do banheiro, tão assustada quanto ela. De acordo com minha tia, assim que ela abaixou o short e foi sentar, viu a perereca… O que aconteceu não preciso contar. Que noite!

Os dias transcorreram e a pauta das conversas era só a perereca no vaso, todos se esqueceram do que aconteceu no desfile, e nem de volta às nossas casas a perereca nos deixou.

São muitas lembranças do carnaval de 1984! Minha família se lembra até hoje dessa viagem, enquanto, certamente, a comunidade da Portela deve se lembrar do título do Carnaval do Rio de Janeiro (conquistado na primeira noite dos desfiles), assim como a escola verde e rosa (Mangueira) também deve trazer nas lembranças a conquista do título na segunda noite e a premiação da campeã das campeãs.

Enfim, enquanto minha família foi surpreendida com arremessos de coisas pelos foliões em plena avenida, os mangueirenses surpreenderam ao dar meia-volta no final da passarela e cruzar a Sapucaí “na contramão”, encantando os presentes.

Pensando neste ano, 2021, em que estaremos isolados, sem comemorações e viagens, vamos ficar em casa e contar histórias. Acredito que assim como eu e minha família, muitas pessoas da minha época, e que viviam no interior, devem ter muitas histórias engraçadas experienciadas no carnaval. Resgatar as memórias da infância é vivê-las um pouco no presente!

Experimente, a festa familiar pode ser muito animada!

Adriana Silva – Belas Urbana. Pedagoga de formação, apaixonada pelo poder transformador da educação e movida por desafios, propósitos e pessoas, há sete anos está no terceiro setor atuando em Programa de Primeira Infância.
Nunca pensou em escrever, mas trabalhou durante anos com crianças em processo de alfabetização e, talvez isso, tenha sido a inspiração para aceitar o convite e compartilhar uma história da sua infância
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