Passei os últimos tempos, dito aqui como “últimos” propositadamente, dedicado tão somente às coisas. Prateleiras novas para grãos que sempre adio com delivery e autossabotagem, cafeteiras novas para aquele café que nem amo, quadros novos emoldurando antigas lembranças, e muitas mudanças embaladas pelo som do interfone. Andei assim, sem sair do lugar. Reparando o terraço para visitas que não chamo, em vez de reparar em mim e nas saudades que aqui residem comigo… Fui esse desvio todo. Alimentando o cachorro com ainda mais brinquedos e um amor culpado, recentemente invocado na terapia, sem que eu entendesse a urgência de também me alimentar, junto, de amor próprio um tanto esvaziado… Deixei me deixar de lado. Abastecendo os vazios pela casa na mira do lar que nem sei ainda qual é, e que talvez já até pudesse ser, meu, perfeito, se meus olhos se permitissem buscar contato com meus desejos tão negligenciados pelo hábito. Desconexão voluntária, acho. Das defesas que a gente arma sem nem perceber. Fato é que segui assim, fugindo dos confrontos com a dureza do espelho, enquanto recauchutava o que via pela frente de material, com a eterealidade suspensa nessa clara fuga suspeita. Hoje clara, digo. Vista. Deflagrada. Mas chega de fingir e fugir, é hora de realmente dar sentido às mudanças. De sentir as mudanças… Abandonar os “últimos” tempos, em que eu não me dava voz nem vez, e abraçar meus defeitos. Dizer meus nãos, desagradar se for o caso, mas me escolher dessa vez. Se não houver o sorriso perfeito, equilibrado na boca e no peito, vou sem ele mesmo, mas vou. A casa tá direita.. As culpas assumiram o foco da reforma. E talvez eu até me faça um café. No espelho, dado a cruas reflexões, finalmente consigo ver esse outro cara.. Acho até que temos, nessa nova dedicação, boas chances de gostar do que vamos ver daqui pra frente.
Novos tempos aí vou eu.