Eu e meus amigos frequentávamos aquele bar assiduamente.
Era um lugar descontraído, onde podíamos nos divertir de
diversas maneiras, desde uma boa música ao vivo, uma pista de dança, comidinhas
deliciosas, até um vinho de primeira!
Não posso me esquecer da mesa de sinuca, meu lugar favorito,
pois ali conhecia muita gente diferente e a interação era uma constante.
E foi dali que rumei ao balcão do bar, pois queria mais uma
taça, quando de repente a vi sentada, conversando com um rapaz. Deu para ouvir
que falavam algo sobre o Japão, e logo pensei se seria possível ela ter viajado
em algum momento para lá. Na verdade, pouco me importava.
Fazia anos que não a via, desde a nossa triste e definitiva
discussão. Ela foi uma figura importante, mas saiu da minha vida de um jeito ruim,
não deixando boas recordações. Preferi esquecer aquela amizade, pois tinha
motivos sérios para isso.
Peguei minha bebida e passei por ela, fingindo não vê-la;
não sei se ela me viu, sigo com a dúvida.
Nenhuma palavra foi dita, nem tampouco algum gesto foi
feito.
Retomei minha sinuca e fiz uma tacada contínua, deixando a
equipe adversária embasbacada.
Confiante de que eu era mesmo uma exímia jogadora – claro
que isso não passava nem perto da verdade –,
senti uma vontade imensa de dançar. A música sempre teve um poder
transformador em mim.
Na pista de dança com meus amigos me senti feliz! As mágoas do passado não tinham vez… Pelo menos não ali, não naquele momento mágico, onde a melodia me envolvia e fazia com que meu corpo e minha alma estivessem livres.
Simara Bussiol Manfrinatti Bittar – Bela Urbana, pedagoga, revisora, escritora e conselheira de direitos humanos. Ama o universo da leitura e escrita. Comida japonesa faz parte dos seus melhores momentos gastronômicos. Aventuras nas alturas são as suas preferidas, mas o melhor são as boas risadas com os filhos, família e amigos.
Era um dia desses que a gente não tem o que fazer. Fui eu,
mais dois amigos ao bar. Falávamos daquelas coisas do universo que nos rodeia:
Corinthians, Hamilton, MMA, Bolsonaros e outros assuntos irrelevantes de fato.
Cerveja vinha, cerveja ia e gente começava a ter tédio. Muito tédio.
Lascamos a falar mal de mulheres que tínhamos tido. Várias,
citando o nome ou não, eram motivos de risada. Seja pelas manias, pelas
fixações, pelo atrevimento e ousadia. Qualquer valor era motivo de crítica
apenas pelo riso. Ao final, estávamos a contar piadas das mais preconceituosas
que se possa imaginar…
Um de nós, não lembro qual (mas não fui eu, claro), fez o
desafio: Duvido que alguém dessa mesa saia daqui com uma mulher. Trato feito!
Rodamos o bar a procura de alguma desavisada que caísse no nosso léro. Foda-se
o nome, era por honra! Não queria ser motivo de piada no próximo Happy Hour.
Eis que a vi. Uma mulher sozinha, impaciente, meio que
aguardando algo. Me pareceu habituê daquele bar, ou das noites solitárias, algo
que me identifico, não sei como. Sentei ao lado, puxei papo sobre o Jalapão (ou Japão, nem me lembro) ou qualquer outro
local que nunca pisei, mas que, por curiosidade, havia lido na Wikipedia. E que
sorte, ela sabia algo sobre esse local. Ou que azar, não sei. Só sei que o papo
rolou.
Mas a coisa foi andando para um lugar estranho. Ela foi
ficando distante e eu sem bala na agulha (ou na língua). O clima foi esfriando
à medida que percebia o vazio que ambos tinham e a aflição em preenchê-lo era
grande, crescia. Por algum motivo, me identificava com ela, e me atraía por seu
olhar vago, à espera de algo. E não me
refiro aos amigos que deram cano no bar, mas algo da vida que lhe faltava.
Senti uma vontade de partilhar meus medos e angústias, meus
sonhos também, algo que não faço há muito tempo. “Mas basta! Que pensamento
fraco, homem! Solta uma cantada e agarra essa mulher! Você está aí para provar
o poder de seu falo aos colegas, não?”. Essa era a voz que me trazia ao chão.
Ou à lona, não sei.
De fato, em algum momento inesperado ela me beijou. Me beijou como se estivesse à procura de algo dentro de mim. Parece papo de maluco, mas senti que ela estava em busca de alguma coisa que não iria encontrar em mim. E eu fiquei intrigado com isso, ainda mais que ela se levantou e se foi logo em seguida. Me pareceu que já fizera isso antes, dessa mesma forma. Como se estivesse minerando em busca de uma pedra preciosa que perdera…
Logo parei para terminar meu copo, e nisso, pensei em mim. O
que eu estava fazendo ali, meu Deus? Tentei usar alguém para provar algo para
outro alguém. Mas eu mesmo ali não estava… Aliás, quem eu era nessa cena,
nesse teatro de farsa? Um saco de batatas, vazio e sujo talvez.
Voltei à mesa com sorriso amarelo. Tinha provado a eles meu
potencial, mas por dentro continuava a pensar o quão ridículas aquelas noites
estavam se tornando com eles. Precisava mudar meu rumo, mas que rumo tomar, sem
que achem que sou frouxo, porra?
Cheguei em casa quase de manhã, pois fiquei rodando a cidade
até o sol aparecer. Pensei em todas as mulheres que passaram na minha vida.
Casamentos, namoros, noivados, noitadas. O que eu tinha plantado nessa vida
além de sêmen? Realmente, acho que não vou colher porra nenhuma desse jeito.
Abri meu guarda-roupas, separei alguns objetos que guardava e não usava mais. Coisas que provavam o que eu não era. Separei roupas que não mais cabiam, perfumes da moda e remédios azuis. Botei num saco preto e joguei no lixo. Não sei o que me deu, mas aquele dia, depois daquele beijo vazio, me deu uma vontade de mudar algo que ainda não sei o quê. Preciso começar…
Crido Santos – Belo urbano, designer e professor. Acredita que o saber e o sorriso são como um mel mágico que se multiplica ao se dividir, que adoça os sentidos e a vida. Adora a liberdade, a amizade, a gentileza, as viagens, os sabores, a música e o novo. Autor do blog Os Piores Poemas do Mundo e co-autor do livro O Corrosivo Coletivo.
Olhava pela janela esperando que escurecesse rápido para
sair. Gostava pouco de ser vista durante o dia, nos tempos que vivia agora. Se
arrumara de forma descuidada e seguia, o caminho sabia ‘de cór’.
Entrou no bar vazio pela hora, cedo ainda, pediu uma cerveja. Não se dava conta de quando isso tinha virado rotina. Porém, aquela noite se deparou com uma já imaginada e mais ou menos esperada: encontrar quem tanto brincara com seus sentimentos, todo sorriso e sedução, numa mesa próxima.
Sua companhia tinha o olhar distante enquanto ele não parava de falar. De onde ela estava ele pouco podia vê-la , porém, ela via com clareza que tinha chegado ao fim essa história que um dia mexeu tanto com os dois.
Agora, distante de emoções, olhava-o como um qualquer, ou melhor, aquele homem ela não olharia caso cruzasse o seu caminho.
Ela se distraía com o celular e vez por outra dava uma espiada para o lado, apenas força de hábito.
Naquela noite, naquela hora tomara a decisão que já devia ter tomado há tempos: perder de vez qualquer esperança de um retorno feliz e seguir em frente.
Voltar para casa, não sem antes cruzar pela mesa ao lado, onde ele estava, se fazer vista e jurar para si que não mais se sentiria assim.
Nove da noite, calor no quarto desarrumado. Entre revistas, livros e roupas espalhadas resolveu ali começar sua revolução pessoal.
Desapego foi a primeira palavra que veio à mente, e partiu para a ação. Juntou tudo que não vestira por um ano, guardou fotos que nada lhe diziam no momento. Juntou livros e revistas para doar, o quarto começava a respirar novos ares.
Refez a cama com roupas limpas. Pôs uma mala sobre ela e começou a colocar roupas escolhidas com carinho, suspirava, sorria. As roupas escolhidas não seguiam uma lógica, não importando sol, chuva, frio, calor.
O próximo passo foi cuidar das plantas, colocando-as num canto da varanda entre sol e sombra. Passou vistas na sala e cozinha tentando deixar registro na memória da posição de móveis, quadros e objetos.
Já tarde entrou num chuveiro de água bem quente e deixou que lágrimas caíssem junto com a água. Por fim, um jato de água fria! Colocou uma camiseta velha, larga como gostava de dormir e no conforto da cama limpa começou a pesquisar um lugar para onde ir.
Já viajara muitas vezes na sua cabeça, e assim foi. Seguiu sua intuição, deixou tudo pra trás e foi em busca de novos encontros, desencontros ou talvez um porto seguro.
De certo o que ficara para trás não moveria mais seus passos. Agora era a protagonista da sua própria história!
Maria Nazareth Dias Coelho – Bela Urbana. Jornalista de formação. Mãe e avó. É chef de cozinha e faz diários, escreve crônicas. Divide seu tempo morando um pouco no Brasil e na Escócia. Viaja pra outros lugares quando consigo e sempre com pouca grana e caminhar e limpar os lugares e uma das suas missões.
A noite tinha sido uma sucessão de desencontros. Primeiro com os
amigos, o que ela entendeu não foi o que eles entenderam e ela foi parar em
outro bar com o mesmo nome.
Gente estranha tinha por lá. Esperou, tomou uma cerveja, nada de
chegarem, olhou o relógio, nada ainda, mais uma cerveja. Como era fraca para
bebidas, já no final da segunda estava meio zonza, resolveu ir para a terceira,
começou a rir de tudo que observava por ali.
Chegou um carinha na sua mesa, com uma dessas cantadas baratas e
abobadas, mas como ela estava só, aceitou a cantada e que ele sentasse na mesa.
Falaram do Japão, nenhum era japonês, e o lugar mais distante que ela conhecia
era bem perto, mas atrevida que era, não se fez de rogada e do Japão falava sem
parar e ria, porque quem bebe um pouco além da conta ri.
Lembrou da turma de amigos que nunca chegava. Pensou no celular,
mas como de costume, sem bateria. Xingou as velhas gerações por não ter
comprado aquele carregador que pode carregar em qualquer lugar, mas sabe como
é, grana curta.
O carinha que só falava do Japão lá estava a falar sem parar e aquilo parecia uma boca nervosa que precisa ser calada e acalmada; sem pensar lascou-lhe um beijo. Há dois anos atrás ela jamais faria aquilo, mas agora, as águas rolaram e era só um beijo em uma noite de verão, em um alguém, sabe-se lá quem.
Ele ficou boquiaberto e ela foi embora, deixando a mesa e a
conta para ele. Foi embora a pé, rodando aqueles bares, sem celular, cabeça
acelerada, fala lenta.
Pensava nele, tinha saudades dele, do beijo dele. Não, não era
do carinha de cinco minutos atrás não, aquilo era nada, era do outro, do
antigo, do que grudava na sua pele, mas que estava longe, do que tinha a melhor
pegada, pele a pele.
E esses amigos onde estão? Cabeça ia, vinha, voltava e vinham
risadas, ânsia de vômito. Ela era fraca para beber, ficava engraçada, mas assim
na madrugada, sozinha na multidão, com quem podia compartilhar?
Podia passar uma cantada e usar o celular de alguém, mas não
adiantaria porque não sabia ‘de cór’ nenhum número. Eram quase três horas da
manhã, resolveu andar e ir para a praça perto da faculdade, não tinha combinado
de dormir na casa de ninguém, e não queria voltar para a casa da mãe porque garantiu
que dormiria na casa das amigas.
Então, foi para a praça esperar o nascer do sol, a vista era
linda! Já tinha feito aquilo uma vez com ele (ele de novo nos seus pensamentos),
ela ria e tinha vontade de dançar, melhor não, estava zonza mas não totalmente
sem juízo, dançar na rua era um sonho de infância, mas sem companhia não teria
graça.
Na praça, sentou no mirante. Ela, o céu e um celular que tocou.
Sim, tocou um celular que estava perto, ninguém ali, só ela, o céu e o celular.
Não atendeu. Tocou de novo. Atendeu: – Alô, não, não é ela. Não,
não é ela que está falando. O quê? Como assim? Não, não sou. Ah, por favor, não
sou, ligue depois.
Desligou, esperou e o sol começou a clarear o dia, assim como a mente clareava para seu estado normal.
Adriana Chebabi – Bela Urbana, idealizadora do blog Belas Urbanas onde faz curadoria dos textos e também escreve. Publicitária. Curiosa por natureza. Divide seu tempo entre seu trabalho de comunicação e mkt e as diversas funções que toda mulher contemporânea tem que conciliar, especialmente quando tem filhos. É do signo de Leão, ascendente em Virgem e no horóscopo chinês Macaco. Isso explica muita coisa.
Eu gostaria de começar este texto
com uma pergunta, mas como a gente ainda não se conhece, considero que essa não
é a melhor maneira para começar este texto. Melhor eu me apresentar primeiro:
Olá! Eu sou a Geovana Pavanelli, mãe do Vicente, de três anos e meio, esposa do
Daniel, Relações Públicas por formação (e paixão) e atualmente atuo como
Gerente de Pessoas de uma empresa de tecnologia. Muito Prazer!
Agora que você me conhece um
pouco vou direto para a pergunta: O que você estava fazendo em 25 de fevereiro
de 2020?
Se você não estava em algum bloquinho (ou qualquer evento em grupo) por aí, curtindo a terça-feira de carnaval, talvez esteja, assim como eu, arrependida por não aproveitar a última oportunidade que tivemos de aglomerar sem medo. Parece que foi ontem, mas há quase um ano, em 26 de fevereiro, estávamos recebendo a notícia do primeiro caso de Coronavírus no Brasil.
E agora eu te convido a uma
reflexão… Além do kit básico (distanciamento, máscaras e álcool em gel), o que
mais mudou na sua vida de lá para cá? Nós tivemos que nos adaptar a um mundo
novo. Profissionalmente falando, as mudanças foram ainda mais intensas, e o
trabalho remoto passou a fazer parte (se é que ainda não fazia, como é o meu
caso) da realidade de muita gente.
Atuando na área de pessoas, posso
garantir que a cultura do trabalho remoto (que é diferente do home office)
é o futuro das organizações, principalmente na área de tecnologia. Mesmo muita
gente voltando ao trabalho presencial com a flexibilização das medidas de proteção
da pandemia, mais de 86% das pessoas preferiram continuar no modelo remoto e
52% mudariam de trabalho se recebessem
uma oferta full remote (pesquisa da Robert Half realizada em 2020). As
empresas terão que aceitar esse “novo” modelo de trabalho, principalmente
porque, sem ele, em um futuro próximo poderão perder talentos e desmotivar
equipes.
Nesse cenário de pandemia muito
se ouviu falar de como as pessoas precisaram se adaptar ao trabalho remoto, mas
pouco sobre como as empresas precisam se posicionar e orientar a sua liderança
sobre esse novo modelo. Tornar uma empresa remota ou híbrida não é fácil e
muito menos automático, exige maturidade do empregador, confiança no time e
preparação da liderança.
Se aquele modelo de “chefe” que
faz microgerenciamento já estava ultrapassado, e as empresas que viam os seus
colaboradores apenas como recursos já estão ficando cada vez menos atraentes, no
modelo de trabalho remoto esses posicionamentos simplesmente não funcionam. É
responsabilidade das empresas entender esse novo cenário, preparar os seus
times para o trabalho remoto ou híbrido, motivar e alinhar todos os
colaboradores na busca do mesmo propósito e, principalmente, investir na gestão
do trabalho remoto, afinal, ele é completamente diferente do presencial.
E me conta, como foi essa
experiência do trabalho remoto para você? A sua empresa estava preparada?
Eu posso responder pela empresa em
que eu trabalho: por lá o trabalho remoto foi um processo normal e até que
relativamente simples, até porque já fazia parte da nossa cultura, mas vi
muitos absurdos sendo relatados por colegas que atuam nos mais diversos
segmentos, tais como: empresas que não respeitam horários e acreditam que o
trabalho remoto é sinônimo de exaustão obrigatória; que cobram por ambientes
100% silenciosos, quando na verdade é impossível controlar a reforma do
vizinho; que não respeitam que você vive em uma casa com outras pessoas (por
mais que você zele para evitar interrupções) e dão advertência quando seu filho
aparece para pedir para fazer cocô; ou que obrigam mulheres grávidas a
trabalhar em ambientes fechados, mesmo quando a atividade é totalmente
compatível com a atuação remota.
Há um longo caminho pela frente
para que as empresas estejam preparadas para o trabalho remoto ou híbrido, mas a
meu ver, elas terão que se adaptar, pelo amor ou pela dor, esse será o futuro.
Já como mãe de uma criança de
três anos e meio, nada foi mais desafiador do que exercer o lado maternal e
profissional ao mesmo tempo e no mesmo ambiente. É maravilhoso poder estar perto
do meu filho por mais tempo; no modelo presencial era impossível almoçar com
ele todos os dias. Mas também é doloroso vê-lo mais tempo na televisão do que
eu gostaria (e do que é indicado), ouvir ele pedindo minha atenção, quando é
impossível parar uma tarefa.
É uma balança difícil de equilibrar: culpa materna x profissionalismo. Eu sigo tentando fazer o meu melhor nos dois lados, mas confesso que dificilmente o dia termina com a balança equilibrada e, na maioria das vezes, um dos lados pesa mais. Como profissional também há um longo caminho pela frente, e eu também tenho que me adaptar (pelo amor ou pela dor), afinal, esse é o meu futuro.
Geovana Capovilla Pavanelli – Bela Urbana. Relações Públicas, especialista em comunicação e recentemente apaixonada pelo universo de gestão de pessoas. Mãe do Vicente, de três anos, que é a minha razão de viver. Sou uma pessoa intensa que ama trabalhar, ama o filho, ama a família, ama os amigos e, principalmente, amo a mim mesma.
E cabeças pensantes demais e afiliados à hipocrisia, fazem com estupidez as cabeças rolarem, entre o curso da reta, do rumo, da seta e da poesia.
E quando cabeças se envergam diante de letras melodiosas, e as fazem sucumbir nas malhas odiosas, saiam da frente que a pipoca estoura e cada um imerge eletricamente tirando seu abadá durante o frenesi da intolerante discórdia.
E nem é preciso pular em delirante carnaval, que as avenidas diplomáti…camente perfeitas e corretas abolem o abalo da sintonia fatídica e começam a construir, os reencontros vorazes de poetas que nos fazem relembrar, questionar e tratar em súmulas com um “VAR” desenfreado nas pautas bem ritmadas e assimétricas, de acordo em acordes do pleito cênico inquisitivo.
E seguindo a narrativa carnavalesca, vejo-me inquirida sobre a proposta que me implele a responder.
Não, eu nunca fiquei pensando e raciocinando sobre o que cantava durante a alegria do carnaval. E não me machucavam os encontros silábicos da poesia, que hoje se descabelam ao rimar para não cair na rompante demagogia. Ontem, naqueles momentos os olhos febris em sonetos descomplicados, regiam a banda na mesma praça com as negas malucas trazendo no colo o filho bastardo.
E mulatas cadenciavam nos quadris, o rebolado de bundas com carnes reais e Sargentelli é que o diga.
E assim, passei em fases diversas, até chegar no século XX e ter que mudar a trajetória de um gato de dona Chi ca ca, e de um briga de casal debaixo de uma sacada os famigerados cravo e a rosa, e claro que muitas outras poesias, de muitos outros poetas que nos cercam e nos embalaram em palcos, telas, e por aí vamos.
Seguindo essa viagem quando alguns mestres seguem provocando as mentes, e se construindo nas pendências e alegorias pessoais.
Vivemos em estado de trio elétrico…
Joana D’arc de Paula – Bela Urbana, educadora infantil aposentada depois de 42 anos seguidos em uma mesma escola, não consegue aposenta-se da do calor e a da textura do observar a natureza arredor. Neste vai e vem de melodias entre pautas e simetrias, seu único interesse é tocar com seus toques grafitados pela emoção.
O carnaval em Portugal começou como um período para
aproveitar tudo, antes do início da Quaresma, momento de jejum e sacrifícios.
Antigamente, a Igreja exercia enorme poder sobre as pessoas e, no período da
Quaresma, era proibido música, dança, etc. Logo, foi a própria Igreja Católica
que serviu de estímulo para a criação do carnaval em Portugal.
Na época do renascimento, iniciou-se a fase das máscaras e bailes.
Hoje em dia, as festividades carnavalescas são conhecidas
por “entrudo”, ou seja, entrada. Preparação para a entrada da Quaresma.
Nunca houve plumas ou mulheres sem roupa no carnaval antigo. Muito pelo contrário, nas aldeias, as pessoas trocavam as roupas. Por exemplo, homens com roupas de mulher e vice-versa.
As ruas ficavam enfeitadas com luzes como no período do
Natal.
Em algumas localidades, não passava de brincadeiras e
gozações. Em outras freguesias, chegavam a ter carros enfeitados e muita
alegria.
Em algumas cidades, há o desfile dos cabeçudos e gigantones. Em Estarreja, temos escolas de samba. Também há freguesias que optam pelo carnaval luso-brasileiro, com participação de brasileiros e desfiles inspirados nos sambódromos. Em Torres Vedras, a farra fica por conta das Matrafonas, homens vestidos de mulher e carros alegóricos. Em vários lugares há sátira à política. Varia muito de um lugar para o outro.
No entanto, não se parece muito com o carnaval brasileiro.
Nas escolas, apenas as crianças mais novas podem usar
fantasias. Aos estudantes maiores cabe a tarefa de observar e recordar. Muitas
pessoas aproveitam a época para viajar e descansar. Há uma comida típica muito
forte apreciada pelos portugueses no dia do carnaval (terça-feira). Trata-se de
um cozido com muitas carnes, legumes e verduras.
Apesar de ser diferente, acho que vale a pena conhecer e conferir a diversidade que existe em cada canto do país! Há um calendário próprio com a programação de cada região.
Espero por vocês em carnavais futuros.
Eliane PachecoEngler – Bela Urbana, luso brasileira, vive em Portugal a quase 7 anos. Fonoaudióloga de formação de coração, mas atualmente o seu maior amor é pela família. Dedicação quase que exclusiva. Tem se aventurado pelo YouTube e pela área imobiliária.
Você que acorda cedo pra pular Carnaval. Que vai tarde
adentro, noite afora. Que esperou ansioso para camelar ao sol e ao som de
batuques. Não vai poder entrar na folia este ano, porém não passará de bar em
bar pisando em urina fresca, não vai levar passada de mão gratuita e terá seu
dinheiro guardado na pochete no fim do dia.
Brincadeiras à parte, o carnaval foi cancelado! A pandemia
não!
Ainda na espera dos blocos vacinados muita gente vai ter que
reinventar a passagem sem o batuque horas a fio.
O que faria no carnaval será feito em casa e sem o agravante
de ser assaltado ou ferido. Brincadeiras à parte, este texto satírico é só pra
deixar mais ameno o fato de que o brasileiro, folião por definição, terá que
brincar de pijama mesmo. Do Oiapoque ao Chuí.
Mas não se lamente, ouça um álbum novo, ou velho, faça uma playlist,
entretenha-se num podcast, leia um livro engavetado, veja um clássico.
Seu carna vai ser diferente porque todos somos hoje. Não
haverá festas, nem manchetes e fuzuê.
Seu amor sambista vai aguardar a vacina chegar.
Fantasia de coronga nem à vista. A gente não aguenta mais
ver essa praga.
Não há festa. Nem manchetes dos títulos, alvoroço nas ruas.
Tô fria? Não. Realista.
Cozinhe seu prato preferido, sambe na sala até calejar. O
importante é que estaremos vivos para pular feito doido quando o mundo deixar a
folia voltar.
E tá tudo bem! O samba é maior! E tá dentro da gente oriundo que só ele, guardado e protegido.
Meg Lovato – Bela Urbana, formada em comunicação social, coreógrafa e mestra de sapateado americano e dança para musicais. Tem dois filhos lindos. É chocolatra e do signo de touro. Não acredita em horóscopo mas sempre da uma olhadela na previsão do tempo.
Em relação ao carnaval, nesse ano, o desfile das escolas de
samba do Rio de Janeiro passava por grandes mudanças, entre elas a
inauguração do Sambódromo na Sapucaí. Já quanto à infância, eu com apenas 11
anos e meus primos com idades entre 6 e 14 anos, não estávamos interessados no
principal acontecimento do carnaval do Rio de Janeiro, ou seja, que o samba
deixaria de acontecer no asfalto de grandes avenidas e passaria a ter a sua
própria casa.
Naquela época, a chegada do feriado do Carnaval era muito
esperada pelas famílias que viviam no interior de São Paulo, principalmente
pelas crianças. Um feriado prolongado nos dava a possibilidade de viajar e a
torcida era para que pudéssemos sempre ir à praia. O que aconteceu por vários
anos consecutivos…
Tínhamos um tio muito querido que adora viajar e sempre convidava
a família toda… Digo tínhamos porque esse meu tio nos deixou ainda muito
jovem, com apenas 35 anos de idade, vítima de um aneurisma cerebral.
Não quero falar de tristeza, porque meu tio era pura alegria,
e falar desse ano, especificamente, me faz homenageá-lo ao lembrar de algumas
situações engraçadas que vivenciamos na cidade de Itanhaém, município da
Baixada Santista, e que ficaram marcadas para sempre.
A aventura começou já na descida ao litoral, pois como íamos
em várias pessoas e, naquela época, os lugares para compras de alimentos eram
escassos, tínhamos que levar muita comida para dar conta da fome do povo todo,
e para ter espaço para outras coisas que levávamos, meu tio acoplava ao carro
uma carretinha.
Saímos de casa de madrugada, e quando estávamos na Marginal
Pinheiros, um dos pneus da carretinha se soltou e correu na estrada. Eram só
crianças gritando e adultos correndo em direção ao local da parada do pneu.
Graças a Deus, a pista estava tranquila (acredito que pelo fato de estar muito
cedo) e nenhum acidente foi provocado.
Euforia total nos carros, começava ali o nosso carnaval…
muitas risadas, gritos e correria para sairmos da pista o mais rápido possível.
Ao chegarmos na praia, outra situação atípica… Como era a
primeira vez que meu tio tinha alugado aquela casa, estávamos acostumados a ir
em outro imóvel, demoramos um pouco para encontrá-la. O lugar era distante e
com poucas construções, o que deixava o local um pouco sombrio. Os adultos,
imediatamente, começaram a comentar o quão difícil ia ser sair dali para ir ver
o carnaval de rua, e as crianças mais velhas começaram a falar dos perigos da
noite para os pequenos. Muitas risadas e choros.
Meu tio quis alugar uma casa maior para acomodar melhor a
família toda, mas também queria nos fazer uma surpresa: na casa tinha piscina
com escorregador, o que era uma novidade para todos e acabou causando muito
contentamento, principalmente para as crianças, e os choros de minutos atrás se
transformaram em muita alegria e euforia.
Durante os dias, as crianças ficavam divididas entre ir à
praia ou ficar na piscina. E o carnaval de rua durante a noite? Ah, esta é
outra história!
Vou contar aqui o que aconteceu em um dos dias, com duas
situações engraçadíssimas…
A família toda foi assistir ao desfile de rua e, chegando lá,
havia um público bastante animado. Pessoas desfilando em trajes engraçados e
uma considerada plateia acompanhando, dançando, cantando… até que em certo
momento, um grupo que estava desfilando começou a jogar no público algumas
coisas, o que me lembro eram casca de banana, tomate, farinha, fubá, ovos,
entre outros. Minha família toda aglomerada, isso em 1984, certo? Não sabia o
que fazer.
Os adultos queriam correr, mas tinham as crianças que para
enxergar melhor estavam um pouco distanciadas. Como era carnaval, o público
entrou na brincadeira e não era mais possível saber de onde vinham as coisas
que estavam sendo atiradas.
O carnaval acabou cedo para a minha família, tivemos que
voltar para casa porque muitos foram atingidos naquela brincadeira, até ovos
estavam espalhados pelas roupas. Chegando em casa, foi aquela correria para o banheiro,
os atingidos queriam se livrar das roupas e tomar banho.
Lembro que uma das minhas tias teve a ideia de ir usar o
banheiro de fora da casa, que era um pouco afastado, e algumas crianças,
inclusive eu, resolvemos ir com ela. Afinal, aquele seria um local mais
tranquilo, uma vez que a casa estava bastante agitada.
Minha tia entrou correndo porque estava com vontade de fazer
“xixi”, mas ela mal entrou e começou a gritar desesperadamente. Nós, crianças,
não sabíamos o que fazer e fomos chamar os adultos da casa. Depois de algum
tempo, minha tia abriu a porta e mostrou a perereca que se encontrava em um
canto do banheiro, tão assustada quanto ela. De acordo com minha tia, assim que
ela abaixou o short e foi sentar, viu a perereca… O que aconteceu não preciso
contar. Que noite!
Os dias transcorreram e a pauta das conversas era só a
perereca no vaso, todos se esqueceram do que aconteceu no desfile, e nem de
volta às nossas casas a perereca nos deixou.
São muitas lembranças do carnaval de 1984! Minha família se
lembra até hoje dessa viagem, enquanto, certamente, a comunidade da Portela deve
se lembrar do título do Carnaval do Rio de Janeiro (conquistado na
primeira noite dos desfiles), assim como a escola verde e rosa (Mangueira)
também deve trazer nas lembranças a conquista do título na segunda noite e a
premiação da campeã das campeãs.
Enfim, enquanto minha família foi surpreendida com
arremessos de coisas pelos foliões em plena avenida, os mangueirenses
surpreenderam ao dar meia-volta no final da passarela e cruzar a Sapucaí “na
contramão”, encantando os presentes.
Pensando neste ano, 2021, em que estaremos isolados, sem
comemorações e viagens, vamos ficar em casa e contar histórias. Acredito que
assim como eu e minha família, muitas pessoas da minha época, e que viviam no
interior, devem ter muitas histórias engraçadas experienciadas no carnaval.
Resgatar as memórias da infância é vivê-las um pouco no presente!
Experimente, a festa familiar pode ser muito animada!
Adriana Silva – Belas Urbana. Pedagoga de formação, apaixonada pelo poder transformador da educação e movida por desafios, propósitos e pessoas, há sete anos está no terceiro setor atuando em Programa de Primeira Infância. Nunca pensou em escrever, mas trabalhou durante anos com crianças em processo de alfabetização e, talvez isso, tenha sido a inspiração para aceitar o convite e compartilhar uma história da sua infância.
Lembro de muitas histórias de carnaval. Na infância, esperava ansiosa minha
tia Marta e minha prima Gi chegarem do Rio de Janeiro, com a fantasia que minha
tia trazia pra mim igual ao da minha prima. Sempre tão lindas! Lembro de nós
duas na matinê, no salão do clube à espera para desfilarmos no concurso de
fantasias… já fomos baianas, bruxinhas, ciganas etc.
Na adolescência, a primeira vez que fui a um baile à noite estava de
melindrosa, tinha 12 anos e fui uma única noite. Queria porque queria ir, já
que minha prima ia, mas não gostei. Não me senti pertencendo, ainda gostava da
luz da matinê e de ficar jogando confetes e serpentinas… A noite ainda não
era para mim!
Com 13 anos, passei as cinco noites com um grupo de uns 40 adolescentes como
eu, fantasiados de egípcios e gritando: “Alalaooooo, mas que calor”. Aquilo
para mim foi o máximo! Passei as cinco noites junto com o grupo, correndo pelo
salão, cantando sem parar aquele refrão e sem olhar para nenhum garoto. Eu era
mais criança que adolescente ainda.
Já no ano seguinte, 14 anos, começaram a ser mais divertidos os bailes de
carnaval. Nesse ano, lembro que junto com minha amiga Alexandrina, ficamos “apaixonadas”
platonicamente por um mocinho no salão, que nunca nem sequer dançou uma música
com nenhuma de nós. Acho que nem nos via, era “gatinho”, como dizia a gíria da
época dos anos 80 quando era para fazer referência a alguém bonito. Ali eu
descobri que gostei do colorido que a paixão nos traz, mesmo quando não é
correspondida. Ainda era uma menina que nunca tinha beijado na boca.
Com 15 anos, já era mais encorpada, bem morena, e novamente com minha prima
e amigas fizemos fantasias iguais para algumas noites. Éramos piratas com meia
arrastão preta, top vermelho com lantejoulas e um pano de cetim vermelho que
servia de saia, biquine por baixo, porque tudo era bem curto, era moda. Ano que
comecei a ser vista pelos mocinhos. Dançava com um, depois com outro e com
outro pelo salão. Funcionava assim: Tinha uma grande roda e quando parávamos de
dançar com o par, ficávamos no entorno dessa roda dançando até outro convidar
para dançar. Sempre nós, as meninas, esperando passivamente sermos convidadas.
Eu nunca convidava ninguém, poderia justificar com minha timidez – de fato era
tímida demais para chegar em algum moço –, mas não era só isso, era algo que no
fundo estava enraizado em mim. “Isso não é papel de moça, os homens é que devem
tomar a iniciativa”.
Os homens podiam escolher e nos tirar para dançar, mas nós, moças mais
recatadas, jamais faríamos isso. Isso nunca passou pela minha cabeça como algo
a ser questionado, nunca nem pensei, e se quisesse dançar com alguém, por que
não ir tirá-lo também? Nesse ano, me lembro de dois mocinhos que ficavam “me
disputando”… Uma vez, dançando com um deles, um amigo o chamou para brigar, e
ele, como ‘bom macho e fortão’, falou pra mim: “– Tenho que brigar agora,
depois eu volto, me espera”. Eu sei lá qual o motivo da tal briga, na hora o
achei muito valente. “Nossa, uau, ele vai brigar, como é forte! Como é valente!”,
esses eram meus pensamentos.
Bom, os dois que me “disputavam”, o valentão e o outro, eram amigos, esse
outro tinha uma namorada… mas passava por mim quando não estava dançando
comigo e me media de cima a baixo, jogava charme, fazia comentários, mesmo
dançando com ela, sem nenhum respeito por ela. Eu, na verdade, também não
percebia que isso não era respeitoso nem com ela e nem comigo.
Na última noite, a banda tocava até quase o raiar do sol, e nas repetições
do mais um, eu estava dançando com outro mocinho. A música parou e ele veio
todo para cima de mim tentar me beijar, quando o tal que me “disputava” com o
amigo fortão, o que tinha namorada, disse em alto e bom som: “Não mexe com essa
moreninha que eu vi primeiro!”. Como se eu pertencesse a ele, como se eu fosse
um mero objeto.
Como me senti? Sinceramente, naquele dia, me senti desejada, importante, e
estava gostando das investidas do garoto que levou um sinal amarelo do outro.
Eu fiquei passiva, esperando que os meninos decidissem de quem eu era. Como
assim de quem eu era? Eu que deveria escolher! Afinal, eram dois pretendentes,
mas eu não tinha essa percepção e talvez até achasse interessante ser “disputada
como um prêmio”. Hoje consigo enxergar o quanto eu era machista e não tinha
consciência de nada disso. Sou uma desconstrução dessa machista.
Enfim, me despedi, fui embora com minha prima e amigas. Já com saudades
daquele carnaval, que me traz lindas lembranças, mas com água na boca de um
beijo que não aconteceu, mas… a vida é um caixa de surpresa e o primeiro
beijo veio no carnaval do ano seguinte… Mas essa história é outra…
Adriana Chebabi – Bela Urbana, idealizadora do blog Belas Urbanas onde faz curadoria dos textos e também escreve. Publicitária. Curiosa por natureza. Divide seu tempo entre seu trabalho de comunicação e mkt e as diversas funções que toda mulher contemporânea tem que conciliar, especialmente quando tem filhos. É do signo de Leão, ascendente em Virgem e no horóscopo chinês Macaco. Isso explica muita coisa.
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