Hoje saí para caminhar de short verde alface e blusa branca, passei pelo meio da feira. Ninguém me notou, já foi tempo.
Esse mesmo já deixou marcas por dentro e por fora.
Sou da época dos contos de fadas e príncipes encantados em cima de cavalos. Cedo, cedo percebi que os príncipes são os cavalos.
Na primeira paixão, aos quinze anos, no primeiro encontro num belo cenário, uma praia, esperei ansiosa pelo beijo romântico e o que senti foi bem diferente e assustador naquele momento; algo quente em minhas pernas me tirou do feitiço… mal sabia que esse “algo quente” viria vida a fora travestido de bancários, banqueiros, artistas, pretos, brancos, chatos, interessantes, hora estúpidos, hora geniais… muitos, até chegar a grande paixão, achava eu.
Iludida e feliz, fui ao longo de cinco anos. Duas filhas, por fim, apenas uma história de amor, mal sucedida para mim. Ficaram a experiência e dois verdadeiros amores.
Logo a vida se encarregou de colocar mais desencantados no caminho. E novamente me apaixonei por um ser complicado. Solitário, mais velho. Eu achava que iria transformá-lo com o meu amor. Como solitário era, entrava e saía da minha vida sem pedir licença, eu permitia, claro. Até um dia, um basta e resolver viver à toa. À toa no banco da praça, à toa na cama, à toa na grama. E num desses “à toa”, ele me flagrou e resolver se declarar na mesa de um bar aos prantos. Hora, hora, quem não cairia. Caí.
Mudei de malas e filhas para outra cidade atrás desse amor, como estava feliz. Vida seguindo, adaptação e logo percebi que ele conseguia apenas fazer uma coisa; seu mestrado. Eu, as outras 999, para vivermos aquela história. Claro, cansei e saí com duas filhas e mais um dentro da barriga.
Agora o tempo era para filhos, filhos e filhos. Era muito feliz, homens, só o que cortava gramas e os entregadores cruzavam apenas o portão.
Ainda fui tropeçando com alguns pelo caminho até envelhecer e me tornar invisível aos olhos deles.
Há poucos meses atrás ainda dei uns suspiros ao encontrar numa trilha um ser bem apessoado, belo sorriso, simpático. Estávamos procurando uma pequena queda d ‘água e ali nos identificamos; natureza, caminhadas, divórcios, filhos, solidão. A conversa ia bem até que ele invocou um deus e eu falei da minha descrença, o resto dos vinte minutos desse breve convívio, foi o sujeito tentando me convencer do contrário. Terminou após encontrarmos um belo despacho de frutas e eu querendo pegar um maracujá. Não… não… eu compro um abacaxi pra você. Como? Suficiente.
As amigas me chamam amarga. Discordo, me chamo realista e respeitosa com todos. Os homens não são meu foco agora. A estrada foi longa com muitos bons e ruins encontros.
Continuo nas minhas caminhadas, cruzando olhares e aceitando que a minha invisibilidade para eles, hoje não me diz nada. Sou visível para quem me quer visível!
Maria Nazareth Dias Coelho – Bela Urbana. Jornalista de formação. Mãe e avó. É chef de cozinha e faz diários, escreve crônicas. Divide seu tempo morando um pouco no Brasil e na Escócia. Viaja pra outros lugares quando consigo e sempre com pouca grana e caminhar e limpar os lugares e uma das suas missões.