Lá no idos de 1990 li TODOS OS HOMENS SÃO MORTAIS, de Simone de Beauvoir, e ali, na minha ingenuidade juvenil, descobri que, não, eu não queria ser eterna, não queria viver para sempre. Naquela altura me reconciliei com a morte, a quem temia até então, e aceitei o fato de que ela é necessária para o descanso das almas.
Muito jovem que era, com toda a vida pela frente, contentei-me em sossegar e dizer que não temia a morte (como, aliás, não temo: Obrigada, Simone.).
Não pensava em envelhecer e nem me questionava sobre o que isto significa. Parecia tão distante; eu lá com uns 21 anos, sequer me imaginava com 40, menos ainda com 60, 70, 80 anos.
Pisquei e cá estou, com mais vida vivida do que a viver e, bem, agora que ela está à porta, estou me ocupando dela: O que é? Para que serve? Tem vantagens? Vale a pena? Faz sofrer? Dói? Dá medo? É, mesmo, preciso? É igual para todo mundo?
Questionamentos não faltam. Vamos às minhas respostas:
O que é velho? É o que existe há muito tempo? Se for, ainda não estou nesta categoria, pois existo há pouco mais de 50 anos e isto, para os padrões do Universo, não é nada!
É o que não serve mais? Se for, também não me enquadro, pois ainda sirvo para muitas coisas: trabalhar, cultivar plantinhas e horta, ajudar amigos, família e outros tantos que me procuram, dar amor etc. etc. etc.
Para que serve envelhecer? Sendo bem pragmática, parece-me que serve para dar movimento aos ciclos, dar guarida à máxima de que “nada se cria, tudo se transforma”; dar lugar ao novo, em um infinito ir e vir.
Teria vantagens? Hummm… pensando na parte material do ser, não vejo muitas, pois a gravidade é implacável e a oxidação também, o que me leva a ter muito mais trabalho para viver hoje do que há trinta anos. Porém, se o foco é a alma, esta, sim, muito se favorece do passar do tempo. Sinto-me mais sábia, mais conciliadora, mais compreensiva, menos dramática, sofro menos com coisas pequenas, aprendi a separar o joio do trigo, coisas impossíveis há vinte anos.
Vale a pena? Vale demais, porque significa que estou viva e posso experimentar coisas novas, ver minha filha tornar-se adulta, conhecer os rumos da tecnologia, da humanidade e a integração dessas “forças”. Permite-me ter histórias para contar.
Faz sofrer, dói, dá medo? Bem, é esquisito olhar as fotos antigas, dá uma saudadezinha daquela pele firme e carnes duras, mas não dói e nem dá medo, já que ela chega devagarinho: uma ruguinha um dia, uma papadinha no outro, uma gordurinha a mais aqui e acolá. Assim, vou me acostumando com os efeitos físicos do passar do tempo e vou aprendendo a me cuidar cada vez melhor e me aceitar.
É igual para todo mundo? Não deve ser, pois cada um encara a vida e seus fenômenos de uma forma. Envelhecer, portanto, a meu ver, é um processo personalíssimo: há quem, sendo jovem, parece e sente-se velho, e há quem, com muitos anos vividos continua novinho em folha, ou ao menos, novo, vistoso, saudável.
Mas, envelhecer é preciso? É, minha gente, muito preciso, porque é um fato, e quanto mais cedo aceitarmos isso, melhor para nós; e também não é preciso, pois depende de cada um deixar – ou não – o velho entrar.
Valorizar o ser, a essência, para compreender que a transformação da matéria é necessária para a elevação da alma, até que tudo seja imbuído do amor universal, quando, então, habitar um corpo será uma mera lembrança no inconsciente coletivo.
Refletir para escrever esse texto me fez concluir que ENVELHECER é mais um estado de espírito que um processo biológico, e espero jamais ter que me fazer a pergunta feita por Cecília Meireles no poema Retrato: em que espelho ficou retida a minha face? Porque, a minha face, com rugas ou sem elas, marcada pelos anos, flácida ou firme, sempre será EU.
Envelhecer é preciso.