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Olhos de amêndoa quando perde a casca

Quando era garoto, imaginava que, ao chegar na oitava série, seria grande, pleno e responsável. Quando cheguei à oitava, pensava que aos dezoito teria uma apoteose: serviço militar, habilitação, vestibular etc. Seria esse o ápice da minha imaginação.

Quando cheguei aos dezoito, imaginava que a fase adulta chegaria aos vinte e seis. Aos vinte e seis pensava que seria pleno aos trinta, trinta e cinco… aos trinta e cinco entendi que a vida começaria, talvez aos quarenta, mas não tinha tanta certeza.

Cheguei aos quarenta e passei dos quarenta. Estou com quarenta e um e observo: jovens de trinta, trinta e cinco anos procurando emprego ou trabalhando horas a fio para pagar prestações infinitas. Percebo jovens de vinte e cinco com fé em promessas vazias de riqueza nas redes sociais. Os adolescentes dos “dezepoucos” e as crianças me parecem que terão um desafio enorme pela frente para sobreviver e preservar o resto de planeta que minha geração irá deixar.

Parece que perdi a esperança, mas na realidade, sairam as cascas de amêndoa da ilusão que turvaram meus olhos. Percebi que envelheci e não me dei conta.

Essa casca me fazia pensar que ainda era um jovem, que, esperando o momento épico, perdia alguns pequenos momentos bons. Mas entendi que não posso parar no tempo, projetando da minha imagem a um ideal que ainda vou construir. Minha imagem é o que sou agora, é a que tenho e com ela farei meu melhor.

Falar de envelhecer aos quarenta e um parece uma bobeira, mas entender que envelhecer ocorre desde que nascemos, e poder acompanhar minha evolução me faz degustar as delícias e dilemas do momento presente, evitando esperar pelo tempo certo para viver. O tempo passa, e só é implacável para as rugas e para quem não percebe com doçura seu surgimento, degustando o sol do momento presente bronzeando a pele.

Conversando com minha companheira, concordamos que hoje a visão da passagem do tempo em nossas vidas nos diz mais de como vamos nos cuidar para ter saúde plena e atividade que de fato, realizar aquelas maluquices que fazíamos tempos atrás. Queremos estar vivos e plenos no futuro.

A morte vem depois do último instante de vida. Só espero que possa estar vivo no dia da minha partida, vivo ao ponto de no último segundo, saborear tudo que ficará por aqui, enquanto fecho uma porta para a história e sigo ao infinito.

Crido Santos – Belo urbano, designer e professor. Acredita que o saber e o sorriso são como um mel mágico que se multiplica ao se dividir, que adoça os sentidos e a vida. Adora a liberdade, a amizade, a gentileza, as viagens, os sabores, a música e o novo. Autor do blog Os Piores Poemas do Mundo e co-autor do livro O Corrosivo Coletivo.

Crido

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