Sou uma acumuladora de livros, não tenho coragem de descartá-los. Enquanto tenho espaço suficiente vou juntando. Impossível me separar dos romances, biografias e livros sobre viagens. São eternos.
Coleções povoam minha casa, moram comigo Jorge Amado, José de Alencar, Machado, Zélia Gatai, Érico Veríssimo e muitos estrangeiros, Eça de Queiroz, Milan Kundera, Susanna Tamaro, e muito mais gente vivendo em cada obra. Alguns foram emprestados ou doados a parentes, alunos e amigos, não sei se os terei de volta. Não importa. Eles estão lá com alguém que eu gosto e cuida bem deles (assim espero).
O maior consumidor de meus livros é “O menino que rouba livros”, meu irmão, ratão de sebo. Ele adora vir aqui mexer nas estantes e levar alguns de quando em vez. Eu sempre lhe digo: – são nossos, pode levar. Gostamos de ler e sentir o livro. Nosso pai foi o culpado por esse ótimo vício.
Agora, confesso, foi difícil escolher o mais marcante da minha vida. Todos, na verdade, indicaram algum percurso, mostraram exemplos a seguir ou a evitar. Eu tenho em mim um pouco de cada obra.
Custou decidir, mas escolhi: “O tempo e o vento”.
Não quero me alongar, comento apenas a primeira parte, minha preferida, o início da saga da família Terra-Cambará. História tão forte e impressionante que já se tornou minissérie e filme.
As descrições de Bibiana, além do filme “A Missão”, despertaram o desejo de conhecer aquelas paragens. Efetivamente, conduziu-me a viagens imaginárias e, depois, a conhecer o território das Missões.
As personagens femininas: Ana e Bibiana Terra são mulheres exemplares. Talvez algumas das que me levaram a analisar personagens femininos na minha carreira de pesquisadora e motivação para eu ser uma “feminista feminina”. Sempre me identifiquei com mulheres corajosas e arrojadas em seu tempo. Muito cedo questionava sobre como seria minha vida, tendo visto, com desagrado, exemplos familiares de mulheres submissas. Eu rompi com o padrão “mulher margarina”.
Justamente, “O Continente” mostra a coragem e a determinação dessas duas mulheres muito importantes na construção da cultura sulista do Brasil. São heroínas, sobretudo, porque não se entregaram às adversidades de seu tempo rude e machista.
Acho estupenda a forma da obra. Veríssimo intercala períodos sem obviedade cronológica. Como num quebra cabeça literário, desafia o leitor a um exercício mental, criando o clima e transportando numa viagem à região do Minuano, o vento gelado. Cria tensão em lugares e situações tenebrosas, sempre ligando os personagens com o tempo e a dureza dos extremos climáticos dos pampas dos Terra.