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O tempo e o vento

Sou uma acumuladora de livros, não tenho coragem de descartá-los. Enquanto tenho espaço suficiente vou juntando. Impossível me separar dos romances, biografias e livros sobre viagens. São eternos.

Coleções povoam minha casa, moram comigo Jorge Amado, José de Alencar, Machado, Zélia Gatai, Érico Veríssimo e muitos estrangeiros, Eça de Queiroz, Milan Kundera, Susanna Tamaro, e muito mais gente vivendo em cada obra. Alguns foram emprestados ou doados a parentes, alunos e amigos, não sei se os terei de volta. Não importa. Eles estão lá com alguém que eu gosto e cuida bem deles (assim espero).

O maior consumidor de meus livros é “O menino que rouba livros”, meu irmão, ratão de sebo. Ele adora vir aqui mexer nas estantes e levar alguns de quando em vez. Eu sempre lhe digo: – são nossos, pode levar. Gostamos de ler e sentir o livro. Nosso pai foi o culpado por esse ótimo vício.

Agora, confesso, foi difícil escolher o mais marcante da minha vida. Todos, na verdade, indicaram algum percurso, mostraram exemplos a seguir ou a evitar. Eu tenho em mim um pouco de cada obra.

Custou decidir, mas escolhi: “O tempo e o vento”.

Não quero me alongar, comento apenas a primeira parte, minha preferida, o início da saga da família Terra-Cambará. História tão forte e impressionante que já se tornou minissérie e filme.

As descrições de Bibiana, além do filme “A Missão”, despertaram o desejo de conhecer aquelas paragens. Efetivamente, conduziu-me a viagens imaginárias e, depois, a conhecer o território das Missões.

As personagens femininas: Ana e Bibiana Terra são mulheres exemplares. Talvez algumas das que me levaram a analisar personagens femininos na minha carreira de pesquisadora e motivação para eu ser uma “feminista feminina”. Sempre me identifiquei com mulheres corajosas e arrojadas em seu tempo. Muito cedo questionava sobre como seria minha vida, tendo visto, com desagrado, exemplos familiares de mulheres submissas. Eu rompi com o padrão “mulher margarina”.

Justamente, “O Continente” mostra a coragem e a determinação dessas duas mulheres muito importantes na construção da cultura sulista do Brasil. São heroínas, sobretudo, porque não se entregaram às adversidades de seu tempo rude e machista.

Acho estupenda a forma da obra. Veríssimo intercala períodos sem obviedade cronológica. Como num quebra cabeça literário, desafia o leitor a um exercício mental, criando o clima e transportando numa viagem à região do Minuano, o vento gelado. Cria tensão em lugares e situações tenebrosas, sempre ligando os personagens com o tempo e a dureza dos extremos climáticos dos pampas dos Terra.

Flailda Brito Garboggini – Bela Urbana aquariana. Formação e magistério em marketing e publicidade na PUC-Campinas. Doutora em comunicação e semiótica. Dois filhos e quatro netos. Hobbies: música, leitura e cinema. Paulistana por nascimento, campineira de coração.

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ENQUANTO LEIO, A CASA É NOSSA

Livros… imagine que você está em frente a um lugar desconhecido, a porta se abre lentamente e você vai entrando, com alguma cerimônia, apreciando as primeiras pistas sobre o que virá depois do próximo passo. Esta é a minha sensação ao iniciar uma leitura. É como se eu fosse recebida pelo autor em sua casa, no seu universo e, por um tempo é também a minha casa, o meu pouso…

Assim, a leitura é para mim um lazer e um direito. É por ela que eu me valho das melhores aventuras e viagens internas e distantes e profundas.

Eu poderia falar de muitos livros e de várias guinadas na vida, no pensamento, no meu próprio despertar… mas, tendo que escolher um, vou ser fiel à minha profunda paixão, que fez mudar a maneira de entender a minha humanidade.

Minha professora de Língua Portuguesa do colegial (atual ensino médio) costumava começar suas aulas com um poema ou trecho de livro escrito a giz no canto da lousa. Como era bom saber que a cada aula, haveria também um presente que eu anotava, atentamente, num caderno de poesias, músicas e pensamentos.

Foi desse modo que, pela primeira vez, eu li algo de Clarice Lispector:

“É tão difícil falar e dizer coisas que não podem ser ditas. É tão silencioso. Como traduzir o silêncio do encontro real entre nós dois? Dificílimo contar: olhei para você fixamente por uns instantes. Tais momentos são meu segredo. Houve o que se chama de comunhão perfeita. Eu chamo a isto de estado agudo de felicidade. Estou terrivelmente lúcida e parece que alcanço um plano mais alto de humanidade. Ou da desumanidade – o it.”

Eu fui tocada e passei a perseguir a autora. Devorava seus livros, ficava atenta às entrevistas dela nos jornais, me encantava com tudo, mas, esse trecho continuava solto, eu não o encontrava nas leituras e era tão forte em mim – Até hoje, eu o digo, sílaba por sílaba, sem precisar ler.

Um dia, numa visita inusitada à biblioteca da casa da amiga de uma amiga, peguei na estante um livro aleatório. Era de Clarice e eu comecei a ler ali mesmo. Pedi emprestado com a maior cara de pau, pois era a primeira vez que nos víamos; ela, generosamente, concordou que eu levasse o livro, desde que o devolvesse, óbvio.

Me deliciei com cada palavra de Água Viva. Até que na página 55, no meio do parágrafo, encontro aquele trecho que ecoava em mim havia quase três anos. Irretocável. Ainda me emociono e me recordo daquela madrugada.

Lia e relia. Fazia ainda mais sentido e melhor, fazia de mim muito mais próxima de Clarice, porque este livro é uma mistura dela própria com uma história que traz toda dualidade humana, em circulação, pela arte, pela palavra, pela intensidade.

Para mim, o livro mais Clarice de todos é Água Viva.

Não muito tempo depois, eu cheguei à página 97, que é o ponto final dessa obra. Mas, ao amanhecer, fiquei profundamente triste. Eu precisava devolver o livro e não sabia como me separar dele. Tanto tempo para encontrá-lo e tão pouco tempo juntos.

Eu tinha necessidade de reler e grifar e interagir com aquela história para me sentir viva, inteira e lúcida, como a protagonista.

Resolvi esse impasse passional com uma ligação. Encomendei um exemplar para mim e entreguei aquele à dona, sem remorsos.

Reli Água Viva muitas vezes. Há muitos outros trechos lindos e significativos que transformam o olhar e ensinam sobre a beleza submersa em cada um de nós.

“Aquilo que ainda vai ser depois – é agora. Agora é o domínio de agora. E enquanto dura a imprevisão eu nasço.”

Quando Clarice Lispector abre a porta, eu me sinto em casa, de verdade.

(Leiam: Água Viva – Clarice Lispector – minha edição é 9ª. da Editora Nova Fronteira).

Dany Cais – Bela Urbana, fonoaudióloga por formação, comunicóloga por vocação e gentóloga por paixão. Colecionadora de histórias, experimenta a vida cultivando hábitos simples, flores e amigos. Iinstagram @daniela.cais

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Uma caixa de livros

Eu tinha por volta de 16 anos quando um vendedor me abordou na rua.

Ele me ofereceu uma caixa de livros por uma quantia que eu podia pagar, com um dinheiro
que tinha de alguns bicos que eu fazia. Eu nem sabia que tipo de livros tinha na caixa, mas
eram livros, me senti comprando um tesouro.

Eu era compulsiva por escrever, tinha inúmeros caderninhos com meus escritos e ninguém
sabia. Eram poemas, contos, diários…E a partir daquele momento, aquela caixa mágica.

Quando cheguei no meu quarto, meu esconderijo, e abri a caixa, o primeiro que eu vi: “Morro
dos ventos uivantes”, de Emily Brontë. Um romance proibido entre Heathcliff e Catherine.
Rústico, selvagem, sedutor, rebelde, do início ao fim. Um livro que recebeu várias críticas na
época.

Todo final de tarde eu me recolhia para viajar no livro, e era num lugar secreto, o morro
vermelho da cidade. Era um morro da cidade de Jaú, uma cidade montanhosa e ele era o ápice
do local. A leitura tinha que ser lá, longe de tudo e de todos, era o meu momento particular.

Um local meio proibido por se tratar de ser longe, mas eu ia com a minha bike e ninguém
sabia, nem notavam minha falta. Eu fugia daquela loucura e ia…

Chegava suada da pedalada intensa, sentava no chão e abria o livro. Que capa, meu Deus!

Uma história de amor gótico, cheia de fantasmas reais e imaginários, um romance inusitado,
indescritível…enigmático. Era o meu momento secreto com aquelas páginas…com os
personagens, cada um deles. Um cenário fantástico que a minha mente formava e sentia.

Que viagem! Aquele livro me salvava…

Lembro até hoje quando li o último capítulo e comecei a chorar, pedindo aos prantos para a
autora: “por favor, continua…continua…”

Naquele dia eu vi o mais lindo entardecer da minha vida…O sol se despediu com uma
mensagem…e nos meus anseios era para mim. “Sonhe”.

Passei a imaginar a vida mais cheia de cores…Esse é o poder de um livro.

Leia…Leia…Leia…

Siomara Carlson – Bela urbana. Arte Educadora e Assistente Social. Pós-graduada em Arteterapia e Políticas Públicas. Ama cachorros, poesia e chocolate. @poesia.de.si
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Um livro que me marcou…

Um?! Difícil escolha… são tantos “amigos”, “amores”, tantas “viagens”, mundos explorados… tantas descobertas, sonhos sonhados numa página.

Sempre o mais atual é o que me marca porque quando estou com um livro que me prende é como se um portal se abrisse e eu passo a fazer parte daquela narrativa… respiro junto em traços de tinta e as palavras fluem pelas minhas veias… mergulho nas páginas, as letras se movem….

Desde Proust à Paulo Coelho… de clássicos à comerciais… o que me encanta são os personagens, a linguagem fluída, a possibilidade de conhecer mil mundos sem ao menos sair do lugar.

Um livro que me marcou foi “A menina que roubava livros”… numa realidade de guerra, onde a dor e caos estavam por todos os lados (qualquer semelhança não é mera coincidência) os livros proporcionavam a fuga necessária para se manter a sanidade… Mas não foi isso que me marcou…

Me apaixonei pela Morte nessa bela narrativa.

Não, não é necessário que se preocupem, pois essa paixão não é daquelas que me fizeram flertar com ela ou colocar minha vida em risco… muito pelo contrário.

Me apaixonei pela figura representada da Morte que não tinha prazer nenhum em levar àqueles que os vivos tinham feito chegar até ela… apenas realizava seu trabalho. Uma figura simples e ao mesmo tempo complexa que se permitiu ter compaixão num determinado momento, mesmo contra toda a sua essência.

Em meio ao caos, que a gente continue tendo refúgios e, que a gente consiga ser mais flexível mesmo que uma vez na vida.

Adriana Rebouças – Bela Urbana, formada em Publicidade. Cursou gastronomia no IGA – São José dos Campos. Publicitária de formação e Chef por paixão. Sócia do restaurante EnRaizAr em São José do Campos – SP.

Foto Adriana: Taine Cardoso Fotografia
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A Arte de Amar

Sinto-me lisonjeado ao ser convidado a relatar sobre um livro que me marcou, tarefa que me excita ao me lembrar de qual, visto que são inúmeros, no sentido do encantamento quanto a conteúdo, como também por ter contribuído no meu autoconhecimento, como todo excelente livro.

Leitura é um dos meus hobbies preferidos e eu a tenho como o nutriente da alma.

Vieram-me à mente vários livros, fiz uma viagem ao tempo, lembrando-me desde a coleção de Monteiro Lobato, o Sítio do Pica-Pau Amarelo, passando pelos técnicos da época da faculdade de Psicologia e da Pós-Graduação.

Poderia citar inúmeras obras, porém cito A Arte de Amar, de Erich Fromm, que, como o título sugere, amar é uma arte e como tal requer conhecimento e prática, desmistificando o conceito de amar como sinônimo de paixão,  confusão esta aceita e reforçada pela nossa sociedade.

Coloca o amar como qualquer outra arte, mencionando os vários tipos de amor e diferenciando o amar dito saudável do neurótico.

É encantador, coloca o amor como resposta mais completa ao problema da existência humana, e sugerindo a maneira de obtê-lo e conservá-lo.

Na introdução já há um indicativo desta jornada quando menciona o Filósofo Grego Paracelso: quem nada conhece, nada ama. Quem nada pode fazer, nada compreende. Quem nada compreende, nada vale, mas quem compreende também ama, observa, vê. Quanto mais amor houver inerente em uma coisa, tanto maior o amor. Aquele que acredita que todos os frutos amadurecem ao mesmo tempo como as cerejas, nada sabe a respeito das uvas.

Em suma, ler é uma viagem, um passeio as profundezas do ser, do Self, permeado por uma infindável imaginação.          

José Eduardo Bertazzoli – Belo Urbano. Psicólogo Clínico, especialista em Dependência Química e Psicopatologia, atualmente trabalhando no Centro de Atenção Psicossocial, CAPS Álcool e Droga Reviver, do Serviço de Saúde Mental Dr. Cândido Ferreira. Amante de leitura, mitologia, poesia e esporte.. acredita na realização do potencial humano.

                                                                                                                                                                                          

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O Retrato de Dorian Gray

Vou fechar os olhos e o primeiro livro que aparecer na minha mente eu escolho, O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde.

A primeira vez que li, gostei tanto, que não consegui parar… Não interrompi a leitura de jeito nenhum.

O Transtorno de personalidade narcisista do protagonista do livro nos assusta. Dorian Gray se entrega, completamente, ao modo de vida de Lord Henry Wotton (um dândi da aristocracia Vitoriana)… Uma espécie de pacto com o demônio que se inicia com a obra prima de Basil Hallward (um pintor moralista que faz o retrato de Dorian Gray).

O livro traz, entre outras personagens, Sibyl Vane. A jovem atriz e cantora, que se apaixona por Dorian Gray e se mata ingerindo ácido cianídrico… E também James Vane, irmão da atriz, um marinheiro que, sem sucesso tenta vingar a morte da irmã… Um livro magnífico.

Um livro magnífico.

Fernando Farah – Belo Urbano, graduado em Direito e Antropologia. Advogado apaixonado por todas as artes!

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A Bolsa Amarela

Procurei nas minhas prateleiras e não encontrei A Bolsa Amarela. Não, leitor se você pensa
que estaria no armário de roupas, você está muito enganado. Seria nas prateleiras da
biblioteca particular, em quarto pode morar, ali livros organizados por ordem de sobrenome
do autor: Nunes, Lygia Bojunga.

Liliane, por Lygia ser uma mulher, você não deveria tratá-la como gênero feminino?
Com segurança respondo: não sei. E sei que você que me lê hoje, possa ser um leitor, uma
leitora ou leitorx. E estou muito feliz por ter meu texto lido! Fica aqui registrado, meu muito
obrigada!

Foi dentro da Bolsa Amarela que vi meus desejos e angústias de adolescente muitos
parecidos com a da personagem principal. Uma menina chamada Raquel e ela tinha três
desejos: ser menino, ser gente grande e escritora.

A Raquel, amiga de um galo chamado Rei. Eu hoje adulta realizada, quase escritora e amiga do
Otelo Otelino, ora cão, ora menino – O Grande Ator Canino -; entendo a mais pura vontade de
ser menino. Em um mundo que somos educadas para sermos quietas, servis e realizadoras de
vontades alheias. No ar o anseio pela liberdade.

E em 2019, a notícia de censura. Um vereador na cidade de Limeira- SP, em nome da família,
da moral, bons costumes e outras coisas que só fazem os sonhos morrerem, conseguiu
enxergar “Ideologia se Gênero” no livro, quis retirá-lo da grade de leitura dos estudantes.
Gente esdrúxula! Quadrada! Enferrujada. Tomara que tenha conserto. Quem sabe, tenham o
mesmo destino do alfinete encontrado por Raquel. Ela o pegou, o limpou, o desentortou, o
desenferrujou, experimentou na pontinha do dedo. E viu que ele era afiado toda vida! Poxa! E
mesmo assim o pôs pra morar no bolso bebê da Bolsa Amarela.

Que os sonhos sempre sobrevivam e planem no céu livres como pipas.

Liliane Messias – Bela Urbana, é pagadora de profissional: bancária. Cresceu na hoje vacinada cidade de Serrana-SP. Fez Letras em Araraquara. E adora dançar.
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Entre as estações de Paris e Rio de Janeiro

Era uma noite de setembro, nos meus idos vinte e poucos anos, e meu eu ali, enfiado num assento de janela, no fundo vazio de um 432 laranja, em sua inconveniente mania de dar a volta ao mundo. Um ritual de respeito, que seguíamos à risca, ele e eu, devo dizer.

A viagem era a mesma, na missão de me devolver pra casa – o trapo que fosse, depois do dia desafiado entre trabalho e faculdade, e eu ia assim, me escondendo do sono entre os capítulos do livro da vez, nas esquinas do “era uma vez” escolhido, cortando a cidade com o fio da imaginação.

Até que, de uma só vez, e sem qualquer antecedente, me vi preso inconteste numa Paris de 1820, alheio ao peso incômodo daquela edição antiga de “Os Miseráveis”, dada a completa anestesia de ver caber, também ali, meu Rio de Janeiro de 2004 perfeito nas falas cruas daquele autor hipnótico.. – E eu jamais voltei daquela viagem.

Até hoje, muitos eus depois, não sei escolher o que, especificamente nas linhas daquele tijolo verosímil, levou embora a parte de inocência que precisava mesmo ir, dando lugar e voz a uma consciência que até hoje fica e grita por humanidade e igualdade.

Talvez Jean Valjean, andando à toa pelas ruas de Vila Isabel, tenha visto pela janela do ônibus o tanto que eu não podia enxergar de realidade a minha volta. E em mais uma de suas generosas jornadas de resignação, fez sinal pra mim e me acordou desse transe insano que nos cega diante da miséria cotidiana.

Não sei… mas aprendi, naquela inesquecível volta ao mundo, que “viajar é um constante nascer e morrer”, e que aquele “eu” que nascia, entre as estações de Paris e Rio de Janeiro, saberia pra sempre o valor de um pão, de um livro preferido, e o da mais justa empatia.

Bernardo Fernandes – Belo Urbano. Um gêmio canceriano, e um ingênuo de 35 anos, nesse contínuo processo insano de se descobrir. Achou na Comunicação uma paixão e uma labuta, e vive nessa luta de existir além do resistir, fazendo diferente e diferença… Ser feliz de propósito, sabe? Sem se distrair desse propósito. E vai assim, escrevendo o que a alma escolhe dizer, tocando o que a viola resolve contar, fazendo festas com cachorros e amigos perdidos, e brincando de volei, de pique, e de ser feliz na aventura da sua viagem. Vai uma carona?
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Onde era livro, onde era eu

Já passaram pelo menos 53 anos desde meu primeiro livro. 

As leituras me acompanharam nas insônias, nos dolce far niente dos momentos de folga, na compulsão desmedida ao fazer pedidos ao Círculo do Livro, nos aeroportos….

Conheci lugares, pessoas, diálogos criados por outros, a ponto de nem mais saber onde era livro, onde era eu.

Todos os estilos, capa dura, brochura, romance, poesia, policial, terror, ficção…. de tudo um pouco.

Daí começou a busca pelo espelho.

Pela fonte da saciedade que vem com o tempo.

E,  já cansada de tanto tentar, vi um dia o reflexo da minha mente, do meu coração. “Parto de Mim”, da Ana Jácomo. Foi assim.  Simples assim. 

São grades da memória. Construídas de forma gradativa e soldadas firmemente. 

Medos, indecisões, reflexões… tanta solda de boa qualidade. 

Sonhos como serras rompem o pensamento repetitivo e me jogam para longe de onde caio em pé. 

Não há flores no caminho. 

Apenas vento me impulsionando ferozmente. 

Não sei aonde chegarei.

Mas não posso desistir. 

E espero pelo meu amanhecer. Os sons do fim de madrugada já me tiram do estado hipnótico do sono profundo.

Espero pelo meu amanhecer.

Ruth Leekning – Bela Urbana, enfermeira alegremente aposentada, apaixonada por sons e sensações que dão paz e que ama cozinhar.  Acredita que amor e física quântica combinados são a resposta para a vida plena.
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Sobre livros e seus efeitos

Como muitas pessoas sou uma leitora, as vezes constante, as vezes nem tanto, certamente ao longo da vida sempre leitora, para a importância do livro em minha vida posso utilizar de variados adjetivos: essencial, crucial, relevante, significante, terapêutico e até imprescindível.

Fazendo uma breve retrospectiva, me lembro dos contos dos Irmãos Grimm, nos idos dos anos oitenta, em casa o dinheiro era curto, meus pais tinham preocupações financeiras maiores do que gastar na compra de livros, felizmente meu avô ganhou uma coleção linda de capa dura dos Irmãos Grimm e foi aí que eu me encantei com a ficção, aqueles contos estranhos povoavam minha imaginação, tinha medo e ao mesmo tempo me maravilhava com as histórias, fui crescendo e encontrei “O colecionador” me deparei com a obsessão e psicopatia, um universo de vocabulário muito alheio ao que eu estava acostumada, no meu ambiente todos eram muito humildes e nem tinham frequentado a faculdade, esse livro me trouxe palavras que eu buscava no dicionário, apesar da dificuldade no entendimento, rapidamente  me envolvi tanto na história que andava na rua com medo das pessoas, me compadecia da vítima  e no fundo (não sem culpa), também do sequestrador, quando o livro terminou fiquei impactada por dias e dias.

Quando li “Eu, Cristiane F., 13 anos, drogada e prostituída” fiquei chocada com os detalhes tão esclarecedores e a coragem do relato, também vi o filme e apesar de ter tido contato com drogas em diferentes épocas da minha vida ouso dizer que aquele livro me livrou (desculpe o trocadilho) de muitos problemas, sempre tive na memória o retrato da degradação humana descritos naquele livro e isso me manteve longe de passar de determinados limites em se tratando de drogas, recentemente a curiosidade me levou ao segundo livro “Eu, Cristiane F., a vida apesar de tudo” e pude comprovar como as drogas destruíram a vida dela e como ela vive hoje.

Amei ter encontrado “O lobo da estepe”, foi um mergulho interior, me identifiquei tanto com essa obra, me fazia refletir sobre a vida e até doía, parecia que ia me dominar, naqueles dias me lembro de não querer nem interromper a leitura, me sentia deprimida e ao mesmo tempo tão viva, enfim só mesmo quem sente o mesmo para entender o impacto daquelas palavras. Depois veio “Cem anos de solidão”, que livro!

Enfim, são tantos livros maravilhosos que passaram por minha vida, cito alguns mais recentes: A quadrilogia de Elena Ferrante “A amiga genial”, seu estilo é incomparável, cheguei a ter o luxo de ficar um sábado todo lendo, foi uma delícia, uma enxurrada de sentimentos, chorei, sorri, me emocionei, viajei, me deprimi, me decepcionei e finalmente chorei de saudades dos personagens, nunca tinha tido a experiência de ler livros tão extensos e foi uma ótima surpresa ver como podemos nos aprimorar no hábito da leitura e ao contrário de fazer dieta é muito mais fácil.

Acredito firmemente que além de nos trazer conhecimento, nos modificar culturalmente os livros moldam nosso caráter para melhor, e seus efeitos são terapêuticos, já fiz terapia em diferentes momentos da minha vida, mas nenhum psicólogo foi capaz de despertar mudanças duradouras e compreensão profunda, uma maneira totalmente nova de pensar sobre determinado assunto (os famosos “insights”) quanto os livros conseguiram fazer comigo.

Quando li um texto do escritor Neil Gaiman sobre ficção e a importância da leitura, chorei, pois, percebi todos aqueles benefícios advindos da leitura em minha própria vida, muitos livros me salvaram da angústia, me mostraram outras soluções e me levaram a voltar a amar e a nunca deixar de acreditar que tudo pode melhorar não importa o tamanho do poço. Deixo aqui o link https://papodehomem.com.br/neil-gaiman-e-o-poder-da-leitura/.

Finalmente não poderia deixar de mencionar humildemente como me senti honrada em participar com um texto no livro “Precisamos falar sobre relacionamentos abusivos” iniciativa da idealizadora do projeto Adriana Chebabi desse blog.

Com os que já foram fisgados pelos efeitos do livro na própria vida eu termino compartilhando meu absoluto e irrestrito amor pelos livros e com os que ainda não, eu os encorajo a provar.

Eliane Ibrahim – Bela Urbana, administradora, professora de Inglês, mãe de duas, esposa, feminista, ama cozinhar, ler, viajar e conversar longamente e profundamente sobre a vida com os amigos do peito, apaixonada pela “Disciplina Positiva” na educação das crianças, praticante e entusiasta da Comunicação não-violenta (CNV) e do perdão.