No meio da correria daquele dia, ela sempre estava correndo, contando o tempo para não perdê-lo. Sempre pensando no depois, se preocupava com tudo, para não faltar para ninguém que amava, mas naquele dia resolveu mudar o caminho…
O caminho no meio da tarde corrida.
Ela evitava passar por ali, a dor ainda era grande, mesmo depois de alguns anos. Fugia daquele percurso, mas ontem não, entrou naquela rua, parou na frente da casa que não existia mais – ela já sabia –, mas desta vez estava sem os portões.
Olhou o terreno de dentro do seu carro, caía uma chuva fina e o dia estava cinza. A árvore continuava firme, linda, no fundo do terreno.
Tão contida era ela, mas ali não se conteve, saiu do carro, pediu para o moço que limpava o terreno do lado – que agora eram um só – se podia ir até a árvore.
Andou devagar, o salto afundava na lama, aquela cena era incomum, ela sabia, cenas únicas, vividas em câmera lenta. Ela era a protagonista e naquele momento não quis saber do próximo instante, esqueceu de contar o tempo, esqueceu do que iria preparar para o jantar, dos óculos que tinha que levar para arrumar, do horário que marcou com a gerente. Só fez o trajeto devagar, sabia que era raro.
Chegou na árvore que continuava viva, rica, nascendo frutos. Encostou sua mão, fez uma prece. Chorou, de saudade, de emoção, nostálgica de algo que não existe mais. A árvore permaneceu, continuava forte. Os frutos estavam brotando, que emoção ver aquilo. Arrancou um galho, foi embora devagar, iria plantar.
O chuvisco bem fraquinho continuava, o moço, intrigado, perguntou:
– Acerola?
Ela olhou com lágrimas que teimavam em cair e só conseguiu dizer:
– Obrigada.
Entrou no seu carro, colocou o galho no banco do passageiro, respirou fundo, ligou o para-brisa.
Acelerou para o banco, tinha que pegar seu novo cartão, de novo voltou a pensar no que fazer para o jantar e em tudo que ainda tinha que fazer, mas o salto alto com terra denunciava algo sui generis.
Entendeu o tempo de uma forma muito clara, e ali, naquele instante, com aquela consciência, cara a cara com o singular, descobriu e entendeu o que significa quando dizem que novos dias nascem.
Adriana Chebabi – Bela Urbana, idealizadora do blog Belas Urbanas onde é a responsável pela autoria de todas as histórias do projeto. Publicitária, empresária, poeta e contadora de histórias. Divide seu tempo entre sua agência Modo Comunicação e Marketing www.modo.com.br, suas poesias, histórias e as diversas funções que toda mãe tem com seus filhos.
Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh….agora eu é quem fico imaginando o que significou aquela árvore!!!!!
Que coisa…quero mais!
Significou muita coisa, é só isso que posso dizer, o resto é com quem lê 🙂
O conto não acaba aí, o que significava aquele lugar, aquela árvore? Seria um amor do passado?
Pode ser tudo isso Marta, você pode decidir para onde ela vai e o que encontrou ou reencontrou ali!!
Pode ser o que vocês quiserem ou a imaginação permitir. Obrigada pelos comentários…
Maravilhoso! Eu é que estava lá, com o tempo passando devagarinho naquele momento… E logo passou. Mas valeu, pois o momento não vai voltar!
Amei, Adriana!
Que bom que gostou, obrigada!!!!
Me lembrei do livro do Rubem Alves: “Tempus Fugit”. Estou com um livro do Padre Fábio de Melo na cabeceira: “Quem me roubou de mim”. Interessante que seu início de conto fala de duas perdas de nosso época: O TEMPO e NÓS MESMOS. Não nos pertencemos mais, estamos sempre com pressa. Tudo que a tecnologia fez para nos ajudar está nos afastando, nos tornando como elas, rápidos, mecânicos. Nosso coração deveria ser como um forno a lenha e não uma chapa de fast food. A mulher vai até a árvore para reencontrar o tempo, e o que ela deixou lá: Pode ser o seu sonho sequestrado por alguém que não a valorizou, que a aprisionou ou retirou sua identidade, ou pior, sua personalidade. No fundo ela quer mudar o rumo não daquele dia, pode ser que ela quer começar de onde parou, e como não dá mais para voltar, acha que do ponto onde está não se pode mais resgatar. Mas um Jardineiro sempre é sábio, oferece acerola. Ah o tempo…. mais um livro me salta à mente: “Tempo de Esperas”, de novo Padre Fábio. Fazer o que? Precisamos mais de poetas que de filósofos. Já deu o discurso de filósofos em programas de tv, está na hora de ir para o jardim, para a árvore. No éden tinha duas. Uma da vida, outra da morte. Precisamos voltar a árvore…. mas vamos lá Adriana….coloque o conto no forno a lenha, deixe o sabor vir aos poucos e vamos ver onde essa mulher irá…..
Obrigada Renato, ótimas colocações, o tempo…sempre ele….agora onde essa mulher irá é com cada leitor, cada um escolhe pra onde ela irá 🙂
DRI. AMEI ME EMOCIONEI. POR INCRIVEL QUE PARECA ACONTECEU MUITO PARECIDO COMIGO.TAMBEM ESTAVA CHUVISCANDO E NÃO ERA PARA PASSAR POR ALI.TAMBEM ENTREI E FUI ATÉ A JABUTICABEIRA onde também orei e falei com a VO LUIZA…….E SEMPRE QUE POSSO FALO COM O PROPRIETARIO DO RESTAURANTE PARA CUIDAR DELA.PEDI TBEM PARA ELE CORTAR UMA ÁRVORE QUE NASCER DO LADO ESQUERDO DA JABUTICABEIRA PARA NÃO ATRAPALHAR …..MAS ELE NEM PODOU ESSA ÁRVORE. GOSTEI MUITO DRI ……CONTINUE. ….ESCREVENDO.EM TEMPO EU TENHA COMIGO O TEXTO DA PECA DE TEATRO QUE MEU PAI APRESENTOU O SAPATEIRO…..SE TE INTERESSAR…….ESCREVENDO MUITO LEGAL BJS.
Obrigada Maga!! Que impressionante ter acontecido algo tão parecido com você!! Eu quero sim uma hora ler a peça, obrigada, gostei muito do seu comentário, bjs
Gostei muito Adriana e me emocionei, quantos segundos raros como esse temos na nossa vida corrida? Segundos que nos damos de presente, quem é mãe sabe que até chorar virou artigo de luxo, muitas vezes me disse: agora não dá para chorar, chore depois e assim vamos empurrando muitas emoções para debaixo do tapete lá no coração, mas faz parte da vida, muito delicada a escrita e ao mesmo tempo muito forte, ficar frente a frente com o passado e com nossas próprias emoções é intenso. Beijo.
Que delicia ler isso Eliane, obrigada por comentar pelas suas palavras. Bjs