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Cabelos livres

Nasci careca e assim fiquei por mais de dois anos, quase três. Minha mãe colocava um pinguinho de cola branca na lateral da minha cabeça pelada para grudar um lacinho e me firmar como menina. A cola saia na água quente do banho, mas a graça do método faz rir até hoje.

Quando criança, os cabelos pretos e crespos eram indomáveis, difíceis de lidar em tempos onde eram limitados os condicionadores e nem imaginávamos a existência de leave-in, tal qual a contemporaneidade nos trouxe.

Adolescer significou queda e mudanças drásticas no formato do cabelo, que tornaram-se cacheados, mas ainda assim davam trabalho aos olhos dos outros, pois no emprego era obrigatório fazer escova para deixá-los lisos ou prendê-los, ainda que fosse em uma loja com estilo alternativo de shopping center. As hipocrisias do mercado versus a realidade de trabalhadora.

Recusava-me a deixá-los lisos, de certo modo afetava o meu modo de ser e pensar. Parece que, nas poucas vezes em que fazia escova, eu perdia algo da minha essência. Queria que meus cabelos fossem como eram, extensões do meu pensamento cacheado, livre e em busca de vento. Passei, portanto, muito tempo com eles presos, acusados de serem fora do padrão de mercado. Onde eu queria originalidade, pregava-se a repressão.

Mas eu tinha um bom modelo de liberdade para seguir: minha mãe teve os primeiros cabelos brancos aos 16 anos e nunca o pintara, ao contrário do padrão feminino que se impôs por muito tempo às mulheres. Lindíssima, conquistou aceitação e os cabelos lisos foram sendo prateados ao longo da vida, com mais admiração do que recusas.

Aos dezenove anos, começaram os meus e decidi seguir o mesmo percurso. A cada fio branco que aparecia, incorporava-o aos meus fio escuros e fazia com que se sentissem parceiros na minha estética.

Vi nos rostos das pessoas muitos sustos, incômodos e também admiração. Tão nova, por que não pinta? Porque não quero. Nossa, quanto cabelo branco! E logo terei mais, é de família. Menina, assim você vai perder o marido! Se ele está comigo por causa dos cabelos, melhor perder mesmo. Onde você fez luzes? Nunca pintei meu cabelo. Que lindo, queria tanto ter coragem! Entendo, não deve ser fácil largar a tintura.

Nestes tempos do agora, deixei de ser um ponto fora da curva e hoje estou na moda. As pessoas ainda comentam, mas é muito mais elogio do que estranhamento. Agora, quem estranha sou eu ao ver tantas pessoas platinando o cabelo, mas é um estranhamento bom. Vejo tons de azul, vermelho, verde… meninas e meninos. Noutro dia, uma senhorinha com cabelos laranja e tatuagens. Que a gente possa ser e ter a cor que quiser.

Sigamos e vejamos para onde o vento nos leva. Para ser livre, é preciso coragem… até nas pontas dos cabelos.

Gaby Coppola – Bela Urbana. Professora de muitas idades, doutora e pesquisadora, apaixonada por gente, progressista, urbana e dorminhoca.

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Envelhecer é uma ação pessoal

Para me dar ao luxo aos 7.4 aninhos de idade vivida, recolho-me ao dito popular: ninguém é (in) substituível!

Pois é, seguindo a minha teoria, valho-me de que essa frase dada como poética, nos assegura que somos sim, alguém com tantos fatores que se substituem à olho nú!

Haja vista a modalidade desse século XXI denominada “harmonização” que está sendo feita e quiçá refeita, para nos garantir a troca de pele no sentido mais amplo defronte de nosso espelho pessoal, alimentado pelo social!

E esse programa de substituição tem a validez que podemos carregar.

Essa ação nos dias de hoje para mim não tem a ver com envelhecimento, e sim, com a autoestima programamada por algumas dantescas ações sociais!

E ao nos afirmarmos nesse estica e puxa, infla e desinfla, põe e tira, rasga e costura, fica um sou mas, quem não é!

E claro que quando sentimos que houve acertos, pois estamos criando tribos univitelinas e o espelho nos caracterizam como seres da mesma espécie, em gênero, número e grau!

Ora essa!

Difícil de entender a ideia dessa almejada harmonia, caracterização única que vem substituir a pele numa razão social magnânima!

Envelhecer é uma ação pessoal…

Que hoje está sendo diagnosticada por atitutdes sociais implantadas pela lavagem cerebral, que tem especulação por espelhos sensacionalistas dispostos em nossa vida virtual, mais do que a vitalidade que nos cabe, como ação genética personalizada.

Bem, qual a idade para envelhecer?

Ou qual o momento em que sentimos o envelhecimento?

Ora vida!

Ora morte!

Envelhecemos quando nos sentimos sem forças para ter curiosidade pelo mundo ao redor.

Envelhecemos quando necessitamos nos esforçar para raciocinar diante do sou, mas quem não é.

Envelhecemos quando deixamos de quitar as prestações de nosso espelho pessoal, para nos prestar às dívidas de espelhos sociais.

Envelhecemos desde que nascemos…

Pensem um minuto sobre fazer aniversário?

Parabens pra você nessa data querida, muitas felicidades, muitos anos de vida!

VIVA!

Joana D’arc de Paula – Bela Urbana, educadora infantil aposentada depois de 42 anos seguidos em uma mesma escola, não consegue aposenta-se da do calor e a da textura do observar a natureza arredor. Neste vai e vem de melodias entre pautas e simetrias, seu único interesse é tocar com seus toques grafitados pela emoção.

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Enquanto há vida, há tempo

Quantas vezes você disse essa frase?

“Já estou velha para isso”

Ela normalmente aparece nos recomeços.

Nos ciclos que chegam ao fim.

Nas rupturas.

Tem uma razão para essa frase existir.

Você quer saber qual é?

A resistência.

A resistência, gera sofrimento, que gera dor.

E para não sofrer, você dá uma bela desculpa:

“Já estou velha para isso”

“Não tenho mais idade para aquilo”

A vida é feita de dois movimentos: Expansão e Contração.

Mas deixa eu te contar um segredo: “Os dois doem”

O que nos cabe, é decidir qual dor sentir.

Dor da expansão:

Escolhendo e experimentando a diversidade da vida.

Aprendendo a nos relacionar com aquilo que é, sem resistir, entendendo que tudo tem começo, meio e fim.

Vivendo com qualidade de presença e intensidade de vida a cada despertar.

Com visão de futuro, aquele que você desejar.

Ou

Dor da contração:

Preferindo não escolher para agradar os outros, numa busca exaustiva de aceitação e aprovação.

Se relacionando na defensiva, atacando, para se proteger da dor que veio do passado.

Vivendo o apego e a ilusão infantil de que o fim é o pior para qualquer situação ou relação.

A vida é breve, e quero te convidar a trocar seu mantra:

“Não tenho mais idade para isso”, por:

“Enquanto há vida, há tempo”.

Para isso vou propor um exercício, você topa?

Pegue um papel e caneta.

Trace uma linha no centro da folha, é a linha do tempo.

Coloque o passado na ponta do lado esquerdo, presente no meio e o futuro na outra extremidade da linha do lado direito.

Anote sua idade atual no presente.

Imagine que você possa escolher com quantos anos quer morrer, anote essa idade no futuro.

Faça a conta de quantos anos faltam para sua partida dessa janela de tempo, chamada vida.

Agora se pergunte:

“Eu quero repetir os mesmos anos que vivi até aqui pelo resto dos meus dias?”

“O que eu quero viver, experimentar e desfrutar nos próximos anos?”

Desejo que viva cada dia daqui até seu fim, com a intensidade de vida que você merece.

O tempo é curto e não para a cada segundo.

Mas enquanto há vida, há tempo.

Luana Levy – Bela urbana, analista corporal e comportamental. Sua paixão é poder contribuir para evolução da nossa espécie através do seu trabalho, sendo facilitadora do processo evolutivo interno, auxiliando pessoas a encontrarem soluções para seus conflitos de forma mais harmoniosa possível, respeitando seu funcionamento natural. E assim viverem em paz consigo e com o ambiente a sua volta.
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Inevitável

O tempo passa…somos poeira no rastro do tempo que se foi …

Olhando no espelho as vezes me pergunto quem é essa que me olha de volta? Não me reconheço nesse rosto marcado por linhas de expressão, nesse corpo que começa a mostrar os resultados dos anos…

Minhas vontades, senhoras de si, continuam me cutucando a todos os momentos, acho que dou conta de tudo, mas hoje, não mais …

Os passos mais lentos, a vista que insiste nas lentes, mas o cérebro, latente continua a mil.

Envelhecer não é uma luta, mas uma dança do tempo em que fui e o que serei.

Muitas vezes me pego negociando comigo mesma o entendimento das pequenas mudanças que o tempo cobra, mas me sinto plena e feliz com as possibilidades, pois envelhecer faz parte da vida e a outra opção eu não quero encarar no momento.

Felizes de nós que estamos tendo a experiência da vida.

Adriana Rebouças – Bela Urbana, formada em Publicidade. Cursou gastronomia no IGA – São José dos Campos. Publicitária de formação e Chef por paixão. Sócia do restaurante EnRaizAr em São José do Campos – SP.

Foto Adriana: Taine Cardoso Fotografia
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Envelhe-Ser

Já parou e pensou no seu envelhecimento? Como será se você alcançar 80 – 90 anos?

Devido ao aumento da longevidade e predomínio de mulheres idosas penso que eu tenho chances de chegar até lá….

Mas será possível viver com saúde??

Saúde para idosos não significa ausência de doenças.

Utiliza-se o conceito de envelhecimento bem sucedido. Este se relaciona a preservação da autonomia e independência, fatores estes associados, entre outros, à qualidade de vida.

No entanto em algum momento da vida vamos depender de alguém. Em algum momento vamos adoecer ou envelhecer o suficiente pra precisarmos de ajuda em alguma atividade. Seja ela uma ajuda nas finanças ou até na atividade básica de tomar banho.

Só a minoria das pessoas morre subitamente e não passa por isso!

Deixando de lado eufemismos como “melhor idade”… o envelhecimento está associado a perdas em diferentes campos e intensidades individuais. Além da perda da independência, refiro-me a perda da vitalidade do corpo jovem, a morte de entes queridos, e a perda do papel profissional ou familiar, por exemplo.

A maneira como iremos encará-las e como nos permitiremos ser cuidados são essenciais.

Mas o que esperar da sociedade em geral e dos nossos cuidadores? Esperamos ser bem cuidados e respeitados pelos outros, certo?

Que tal também não sermos infantilizados, termos nossas histórias de vida valorizadas e desejos ouvidos, além de termos nossa independência e autonomia promovidas mesmo que em pequenas coisas?

Envelhe-Ser.

Sim, seremos nós em breve. Vamos refletir sobre nossos conceitos, sobre nossa vida e tratar os idosos como gostaríamos de Ser?

Vera Regina Bellinazzi – Bela Urbana. Campineira, médica geriatra e paliativista. Adora receber um sorriso de quem está cuidando. Curte sua família e vivencia o desafio de ter 2 adolescentes em casa. Gosta de plantas, flores, e de dançar. Acredita na meditação como a melhor forma de auto-conhecimento e conexão com Deus.

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Leitor voraz da Folha

Leitor voraz da Folha,

Aguardava sentado na varanda,

Enquanto folhas despencavam,

Ele olhava e admirava, de antemão,

Folhas farfalhando pelo chão.

No entanto,  esperava a Folha,

Cuja notícia diária analisava,

Pensava, discutia e comentava,

Assim foram anos e décadas,

Analisando seu Palmeiras,

Gambás, odiando a vida inteira.

Hoje, vejo uma, duas, três, várias,

Folhas caídas ao chão da varanda,

Farfalham o papel da Folha,

Com outras  despencadas,

Pela ação dos ventos,

Das árvores arrancadas.

Ele deixou de esperar,

Folhas, estão a se amontoar,

Lhe falta agora e não por hora,

Mas, para sempre a visão,

De longe tudo vê,

A Folha não mais lê.

Continua vivo, feliz e ouvindo,

Com a dificuldade da idade,

Enxergando onde a vista alcança,

Porém, para leitura próxima,

A perda sem solução ou esperança.

Fez noventa e um,

Família presente,

Velas a apagar,

Ele impávido,

Discursou sobre a vida,

Diante de pessoas queridas,

Não reclamando de nada,

Agradecendo a Deus,

A saúde ofertada.

Passei pela varanda,

Depois da festa terminada,

As Folhas se entreolharam,

Imaginando que eu fosse lê-las,

As ignorei por muitos motivos,

Por enquanto e felizmente,

A visão me acompanha,

Com a qual posso

A Folha,  ignorá-la,

Ao contrário das folhas

De todas as arvores,

De belezas intermináveis,

Como verdades inenarráveis.

L.C. Bocatto– Belo Urbano. Diretor do Instituto IFEM – Instituto da Família Empresária. Criador da Ferramenta de Análise Científica Individual e Familiar. Formações – Mestre em Comunicação e Mercado, MBA em Controladoria, Contador, Psicanalista Terapeuta com foco em famílias e indivíduo com problemas Econômicos (perda de riquezas) e Financeiros (saldos negativos de caixa)
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Fragmentos de um diário – 35 – Envelheço

Sinto-me sensível nos últimos tempos. Tempos estranhos esses! Mas qual tempo não será estranho?

Envelheço sem grandes vaidades, talvez algo em meu olhar ainda me veja com um certo brilho juvenil… estranho pensar sobre isso, afinal, tenho quase 53 anos… mas é assim que me sinto!

Gosto dos meus fios de cabelos prata misturados com os pretos, de longe ainda vejo a maior parte que emoldura meu rosto escuros. Muitas pessoas a minha volta se incomodam, me falam que é feio, que ainda sou jovem para deixar os cabelos assim. Sou o que sou e acho, pelo menos por hoje, bonito estar assim.

Esse conceito de jovem é estranho também, como esses tempos… Essa conversa de que os 50 são os novos 30, acho uma tremenda bobagem, acho conversa de gente que tem medo de assumir o passar do tempo. Os 50 de hoje são um pouco diferentes dos 50 de décadas passadas, mas porque a sociedade mudou e nós cinquentões estamos inseridos nesta sociedade de hoje e não de décadas passadas, mas, até aí, querer dizer que somos os novos 30 é algo muito simplista para mim.

Outro dia uma endócrino disse que meus ovários estão “falindo”… achei um pouco indelicada sua colocação e fiquei sem dizer nada. A menopausa é isso, mudanças no corpo, mas falir é a palavra ideal para uma médica usar? Olhei para ela, não deve ter chegado aos 40 anos ainda, e pensei que 15 anos passam voando, hoje sei disso, e sei também das saudades que sinto dos meus filhos pequenos e da sensação que passou rápido demais a ponto de ter um gosto de quero mais, mas sei que esse quero mais não é possível. Tenho uma tia que me falava, quando meus filhos eram pequenos, que passava rápido demais, mas só temos de fato a real noção de algo quando passamos por ele e hoje eu entendo claramente o que ela dizia.

Agora tenho que buscar a comida que encomendei, acordar os filhos, mas ando tão sensível… talvez sejam os hormônios, talvez seja mais alguma coisa que está falindo, ou talvez seja só eu mesma como uma fênix renascendo.

Giza Luiza – 52 anos – 13 de julho

Adriana Chebabi  – Bela Urbana, idealizadora do Projeto Belas Urbanas onde faz curadoria dos textos e também escreve. Publicitária. Curiosa por natureza.  Divide seu tempo entre seu trabalho de comunicação e mkt e as diversas funções que toda mulher contemporânea tem que conciliar, especialmente quando tem filhos. É do signo de Leão, ascendente em Virgem e no horóscopo chinês Macaco. Isso explica muita coisa . 

A personagem Giza Luiza do “Fragmentos de um diário” é uma homenagem a suas duas avós – Giselda e Ana Luiza
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EU ENVELHEÇO QUANDO…

Quando eu era pequena, entre 3 e 4 anos, discuti feio com meu irmão sobre qual de nós dois era o mais velho e por não termos argumentos suficientes, recorremos à nossa mãe que sem pestanejar deu a vitória a ele por um ano e meio.

Arrasada, eu chorei copiosamente, me sentindo impotente, preterida e declaradamente, a mais nova. Em minha imaginação e sentimento, ser mais velha era uma prerrogativa poderosa – mais oportunidades, mais sabedoria, o privilégio da dianteira. Eu digeri a mágoa dessa derrota, mas persegui o propósito de ser amanhã mais velha que hoje.

O tempo de ir à escola, de escrever e ler, de estudar fora da cidade natal e  de ver essa distância se ampliando à medida que a idade avançava.

Eu comemorei cada ano, os meses, os dias. Eu mais velha não precisava da confirmação de ninguém.

A percepção do envelhecer como crescimento e desenvolvimento me assegurava que não precisava ter medo da passagem do tempo. Eu sempre acreditei que seria capaz de vencer as dificuldades com o saber/poder adquiridos ao longo da vida e fui me empenhando para construção da minha maturidade.

Até me dar conta que meu pensamento segue na contramão do mundo jovencêntrico, que amaldiçoa a velhice e se agarra na estúpida ideia de que é possível viver sem envelhecer – onde tudo é anti-idade e antienvelhecimento: Forever Young.

É curioso porque de certo modo é como se todo desejo estivesse sentenciado a fracassar – as rugas vêm, os hormônios baixam, os músculos cedem e não adianta negar, falsificar a data de nascimento, plastificar o rosto, o abdômen, o tempo é implacável e a experiência tem seu peso (os nossos joelhos sabem disso).

Por outro lado, enrugada, flácida, mais lenta e mais esquecida, ainda assim, viva! O tempo não nos torna descartáveis, apesar de a todo instante nos enviarem mensagens sobre a determinação social do prazo de validade humano, sobretudo, para as mulheres. Desde a insuportável publicidade, os apelos midiáticos, a incongruência do mercado de trabalho e toda eloquência dos preconceitos velados que chegam fantasiados de elogio ou de piada inconsequente que define velhice, exclusivamente, como o declínio do corpo e da mente.

O preconceito nos encontra quando nos habita e eu posso provar.

Pedi aos amigos no Instagram que completassem a frase “Eu envelheço quando…”

  1. Deixo de sonhar
  2. Me limito
  3. Deixo de ver beleza no que é simples
  4. Não reconheço a beleza de viver com saúde, socializada, atuante e informada
  5. Esqueço a minha criança interior
  6. Paro de aprender
  7. Não me reconheço mais
  8. Deixo de sonhar com novas possibilidades
  9. Me deleito com a confirmação de que na prática a teoria é outra

Olhando para essas frases, com exceção da nona que revela bom humor para encarar as dores e delícias da singularidade do envelhecimento, todas as anteriores expõem o medo e a descrença no processo natural da vida, com delineado preconceito. O limite, o abandono, a paralisia  são um decreto injusto da “homeopática” instalação da morte pelo perecimento do ser.

Eu, com 51 anos, tenho consciência do sofrimento (físico, psíquico e social) causado pela passagem do tempo, mas ainda assim, escolho saudar as maravilhas da maturidade e completo a frase, eu envelheço quando VIVO, quem morre não envelhece.

Sigo mantendo a convicção de que sou hoje mais velha do que fui ontem e, serei muito mais velha, enquanto houver amanhã.

Dany Cais – Bela Urbana, fonoaudióloga por formação, comunicóloga por vocação e gentóloga por paixão. Colecionadora de histórias, experimenta a vida cultivando hábitos simples, flores e amigos. Iinstagram @daniela.cais

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Envelhecencia

Quando abri os olhos naquela manhã e a claridade me envolveu, tive dificuldade de compreender o que via, eram luzes de múltiplas cores que passavam pela janela, percebia a variedade mas me faltavam as palavras para nomeá-las, respirei profundamente e aquele entrar e sair do ar se mostrava relaxante e energizante; percebi que estava deitada e meu corpo não me respondia plenamente, uma certa dificuldade em me mover e controlar todo meu eu; bocejei e não encontrei dentes na boca, a língua brincava solta naquela gruta chamada boca.

Sensações, muitas percepções  me invadiam despertadas por cheiros agradáveis que vinham do tecido da cama onde repousava e da roupa macia e delicada que vestia, percebi contrações no meu corpo e urinei num grande alivio e relaxamento incontido, e percebi que fui salva por uma fralda que prontamente absorveu os líquidos.

Incomodada, naquela situação me manifestei verbalmente e o som forte de minha voz ecoou longe, e logo veio alguém que com sua voz suave e carinhosa me acalentou e passou a me ajudar com minha higiene e em seguida me alimentou; hummm os sabores, que delicia são os sabores, que me invadem as papilas e fazem querer mais; quando fiquei satisfeita me manifestei verbalmente, no entanto aquela que me alimentava não me compreendeu,  mas  sorriu, tento explicar novamente e ela me olha tentando traduzir e compreender minhas vocalizações sem sucesso.  Ela se afasta e fico só no quarto com minhas percepções, sensações e admiração perante a vida. Cochilei.

Fui acordada para o banho, não consegui ajudar e fui despida, virada, molhada, ensaboada, hummm o perfume do sabonete e do shampoo me invadem e me relaxam, hummm a água quente envolvente faz o momento ser especial, mas chega o fim, e já seca ganhei nova fralda e roupas macias e cheirosas.

Com ajuda fui posicionada em uma cadeira de rodas e levada a sala social, pessoas me olhavam, alguns interagiam e aparentavam real interesse em minha pessoa, já outros me ignoravam, tive tempo de olhar e admirar cada ser ali presente, e assim amar a cada um em sua singularidade, amar cada gesto, admirar o local, ouvir suas vozes e os sons do ambiente; quantas melodias naquele ambiente, compreendi que a música me dá extremo prazer.

Viver é observar e escutar mais do que falar, não por acaso temos dois olhos e dois ouvidos e apenas uma boca; a linguagem silenciosa tem muito poder, a linguagem do olhar e do amor se faz nas sutilezas.

De repente, me posicionam junto a janela e mostram os pássaros, os animais da casa no quintal cão e gato, as árvores, flores do jardim e no céu vejo um lindo arco-íris,  presente da leve garoa com aroma petricor.  Vibro inteira, afinal a vida é viver cada momento com a consciência de que é único, um presente e me está sendo dado o privilégio de  desfrutá-la, não sei quanto tempo estarei aqui, se ao fechar os olhos tudo se acabará, mas posso dizer que sorver cada momento é vital. Se estou no fim ou início da vida não faz diferença, idoso ou recém nascido não conto o tempo, pois este se altera frente alegrias, tristeza e amores. Evito os medos paralisantes e me apego aos risos desenfreados. Respiro, me inspiro e não piro.

Thelma Carlsen Fontefria – Bela Urbana, psicóloga, mãe de Isabella, 2 cães, 1 gata, 1 afilhada, 2 gerbils netos, mora em Santos, tentando manter a sanidade neste tempos de um Brasil tão distópico.

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Menopausa

Me-no-pau-sa (substantivo feminino) – def. – interrupção fisiológica dos ciclos menstruais, devido à cessação da secreção hormonal dos ovários.

Simples, não? Nada disso, por que facilitar se podemos complicar, uma vez que a sociedade e principalmente as mulheres associa menopausa à velhice, data de validade, invisibilidade?

E lá vou eu com os meus 52 anos e vivendo o climatério (anos anteriores à última menstruação) bombardeada pelas redes sociais e um milhão de filtros do Instagram, dancinhas de TikTok em um mundo basicamente machista, onde mulheres sempre foram objeto de agrado dos homens, contar a minha experiência. Não deixa de ser uma verdadeira guerra psicológica!

Eu já moro na Alemanha há 5 anos e foi bem na minha mudança para cá que senti o climatério começar.

Primeira parada – Ginecologista.

Minha consulta, onde eu falava inglês e ela falava algo que se parecia com inglês-alemão, foi no mínimo curiosa.

Ginecologista: idade?

Eu: 47

Gin: Você é jovem, ainda não deve estar fazendo mamografia.

Pausa para explicar (aqui a mamografia se inicia com 50 anos, a não ser que tenha histórico familiar).

Eu: Já faço mamografia há mais de 10 anos.

Gin: Warum? Por quê? E mexeu a cabeça em desaprovação….

Eu: Doutora quando devo iniciar reposição hormonal?

Gin: Se estiver se sentindo bem, apenas cansada e com calores, nunca!

Ela me examinou, fez os exames de rotina e disse, se eu não te ligar em 15 dias é que seus exames estão ótimos. Até o ano que vem.

Não me contive e perguntei. Como devo lidar com o climatério? E ela me respondeu, faça muitas caminhadas, se alimente bem, beba muita água e se tiver dores de cabeça tome ibuprofeno, o resto vai passar.

E fui embora correndo pesquisar o que fazer, pois achava impossível ser tão simples…

Descobri então que uma em cada vinte mulheres (2022) faz reposição hormonal na Alemanha contra uma em cada três (2002), e que este número vem caindo. Pesquisando ainda mais sobre o tema descobri que a maioria das mulheres prefere usar plantas medicinais para minimizar os efeitos das alterações hormonais. Tenho uma lista delas. Elas aceitam a menopausa e passam por ela, simples assim.

Mas voltando ao tema desta série sobre envelhecimento, percebo que a alemã é muito mais relaxada no quesito aparência e isso lhe faz um bem enorme ao longo da vida.

Elas são muito mais livres que as brasileiras quando se vestem, cortam o cabelo, lidam com seus corpos e suas formas, uma vez que não se preocupam em agradar ao outro e sim à elas mesmas; e isso é cultural. A Alemanha tem uma sociedade menos machista na qual a mulher tem controle sobre seu papel. A sua importância não é medida pela juventude, magreza e beleza, e sim pelo que você tem a oferecer à sociedade, seus valores, ideias e seu posicionamento. E isso é muito confortante quando o corpo começa a mudar e as rugas começam a aparecer. E tá tudo bem!

Para mim isso foi um baita aprendizado, vindo de uma sociedade machista sul-americana, onde somos educadas para agradar aos homens e sermos jovens eternamente.

Essa lavagem cerebral custa a ser desfeita e fico feliz que estejamos falando mais e mais sobre envelhecer e o papel da mulher neste processo. Vejo cada vez mais mulheres tendo controle sobre seus corpos, desejos e sonhos.

Hoje em meio às mudanças hormonais e as minhas rugas posso dizer com franqueza que me sinto bonita e cheia de sonhos. Sou mais dona de mim, vivo mais intensamente, escolho melhor e tenho muito a contribuir.

Sou mais feliz hoje do que quando tinha 20, 30 ou 40 anos. Os perrengues vão e vem, mas lido melhor com eles.

Não escondo a minha idade, até porque ela me define sim, por tudo que vivi e me tornei, mas ela não me limita!

Silvia Lima – Bela Urbana, publicitária, leonina, mãe do Gabriel e Lucas. Mora em Stuttgart, adora uma viagem, só ou bem acompanhada, regada a muito vinho. É responsável pela área de Marketing Digital
da Push Rio Activewear. www.pushrio.com