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HOMEM NÃO CHORA

Quem foi que disse que homem não chora?

Muitos vão afirmar que homens não podem expor suas emoções em qualquer lugar, a qualquer hora. Estritamente reservadas para momentos de intimidade, as emoções masculinas devem ser moduladas em tom muito especial lá onde as normas sociais não alcançam nem censuram.

Eu sempre ouvi que homem não deveria chorar. Chorar é coisa de mulherzinha. Quando nós homens sentimos que lágrimas vão rolar ainda é indicado engolir o choro, respirar e fingir que somos fortes. Nada de exposição nem manifestações públicas de fragilidade.

Essa interdição ao choro masculino é só mais uma imposição ao comportamento para a autoafirmação masculina. Além disso, uma longa lista de estereótipos que, mesmo com o passar do tempo, continua fazendo parte de um manual de etiqueta dos que se entendem homens. Aí vão alguns exemplos:

– homem deve interessar-se por mulheres;

– provedor do sustento da família;

– homem detesta cor-de-rosa;

– lugar de homem é na churrasqueira;

– homem gosta de carro;

– abre vidro de azeitona;

– homem entende de economia;

– política é coisa de homem;

– homem se reúne com outros homens uma vez por semana;

– homem não vai ao ballet;

– homem quando vai pra cozinha é pra ser chef gourmet

Etecetera, etecetera. Uma parafernália de asserções imperativas numa lógica de “dever ser” que pauta a formação do caráter das criaturas concebidas com cromossomos XY, para o exercício da virilidade e que inclui gerações e gerações nascidas ao longo dos séculos. O homem é, também, o principal herdeiro da cultura patriarcal que oprime mulheres, tem benefícios, liberdades e privilégios que vão desde a circulação urbana até vantagens salariais na grande maioria dos cargos que ocupam – que chega, no Brasil, a 53%.

Tudo isso já deveria ter sido superado. Pelo menos nessa reflexão sobre o assunto eu gostaria que já estivesse resolvido, assim como isso de homem não chorar já deveria ser uma construção ultrapassada. Hoje quando leio a frase “homem não chora”, fico pensando que ouvia isso quando era criança e que acho que não tem mais sentido pensar desse jeito.

Dá pra pensar: homem chora. Nem que seja internamente, nem que seja demonstrando uma agressividade derivada do medo de não satisfazer suas expectativas. Nos dias que correm é mais do que permitido aos homens expressar emoções por meio do choro. Independentemente de ser homem ou mulher, forte ou fraco.

Eu chorei quando nasci. eu sempre chorei, às vezes no canto do quarto trancado. Às vezes no trânsito. Outras vezes, em público. Recentemente fiquei sabendo que meu avô era um chorão também. Chorava em casamento; chorava quando encontrava a parentela ou quando passava por dificuldades financeiras, também. Não lembro de ter visto meu pai chorar. Suas afeições se manifestavam de outros modos.

Todas as emoções estão em nossa inteligência, mas, cuidado!  A caretice está sempre à espreita. Uma sensação reprimida na cabeça é um veneno que pode entoxicar mentalidades. Unir o útil e o indispensável: fazer afeto virar dia a dia. A solidão, o sexo, a morte são temas eternos; são jogos de espelhos. É um caminho sem volta. Chorar nos curar, nos abre os olhos, liga os nossos ouvidos. Mas, além de tudo isso é dever do homem desconstruir-se.

João André Brito Garboggini – Belo Urbano. É publicitário, ator e diretor teatral e tem três filhos.
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