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Saudade da ausência futura

O marido de Laura viajou e ela ficou na cidade que mora com a filha adolescente, Liz, que em apenas alguns meses iria viajar e permanecer distante por um ano, a filha, de 16 anos se alegrou com a possibilidade de compartilhar a cama com a mãe por alguns dias e Laura se encheu de ternura por Liz ainda gostar de dormir com ela, esses momentos eram inestimáveis, as risadas, as conversas antes do sono, Laura ainda vive o luto da infância da filha que se foi, a adolescência traz muitas mudanças e mãe e filha sempre se deram muito bem, mas conforme Liz foi se tornando mais velha vieram os conflitos, os mal humores, as palavras atravessadas, a rebeldia, o relacionamento delas nem sempre era tranquilo e Laura tinha consciência que eram mudanças inerentes à essa fase da vida de Liz, nem por isso menos desafiadoras.

Em um desses dias Laura pediu para a filha arrumar a cama, Liz não gostou, respondeu rispidamente que não iria arrumar e que isso não era importante para ela, não queria perder tempo com isso, se para dormir com ela era o preço que teria que pagar, voltaria para seu próprio quarto, pegou seu travesseiro e edredom e revirando os olhos e pisando forte no chão, saiu batendo a porta do quarto de Laura, a mãe  tentou conversar, não compreendeu a ira da filha, Liz não quis conversa, Laura disse: “não vou aceitar que volte”, pronto, ponto final, não dormiriam mais juntas.

Laura sentiu uma dor quase física e chorou, chorou copiosamente como se alguém tivesse morrido, a filha estranhou essa reação tão intensa da mãe por uma simples discussão das muitas que tinham rotineiramente, a mãe seguiu chorando por muito tempo, horas depois Liz se aproximou de Laura e pediu desculpas, explicou que estava ocupada com seus afazeres e o pedido  para arrumar a cama veio em hora errada, se incomodou, e do alto de sua rebeldia adolescente veio a negativa, perguntou para a mãe como poderiam fazer as pazes e tentar resolver o drama, e por fim voltaram a dormir juntas e felizes na cama de Laura, Liz levou o edredom e travesseiro de volta, se abraçaram e se perdoaram.

Mais tarde em suas reflexões, Laura ainda comovida com a briga, a tristeza, a mágoa, o choro, a intensidade dos próprios sentimentos tentava entender e processar toda a “novela” que vivera, perguntava-se se a menopausa teria a sua participação em tudo isso, talvez sim, talvez ter ficado sozinha na cidade sem o marido, talvez um dia difícil e cheio de responsabilidades e desafios, talvez os pais envelhecendo e a vida que de constante, só mesmo a mudança, talvez a antecipação da saudade, essa que doía mais que tudo da ausência que sentiria de Liz em breve, muito breve.

Eliane Ibrahim – Bela Urbana, administradora, professora de Inglês, mãe de duas, esposa, feminista, ama cozinhar, ler, viajar e conversar longamente e profundamente sobre a vida com os amigos do peito, apaixonada pela “Disciplina Positiva” na educação das crianças, praticante e entusiasta da Comunicação não-violenta (CNV) e do perdão.

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