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Aceita um PORTO?

“A penicilina cura os homens, mas é o vinho que os torna felizes.” Alexander Fleming (1881-1955)

 

O vinho é um presente dos deuses. Assim acreditavam os povos antigos, a ponto dele ser citado em muitas tradições mitológicas e também nos livros sagrados das principais religiões. A Bíblia não apenas faz menção ao vinho (mais de 200 vezes) como também atribui ao patriarca Noé a sua descoberta (e também o primeiro pileque). Porém, há um vinho que foi presente especial: o Vinho do Porto.

Pouco conhecido dos brasileiros, o Vinho do Porto é produzido na região demarcada mais antiga do mundo: o vale do Rio Douro (decretada pelo Marquês de Pombal em 1756). O Rio Douro nasce na Espanha e cruza a região norte de Portugal até desaguar no Atlântico, onde se encontram as cidades do Porto (de onde o vinho herdou o nome) e Vila Nova de Gaia. O duro trabalho dos portugueses nessas encostas de xisto e granito, de solo pobre e árido, onde as videiras são cultivadas em socalcos (degraus), transformou uma região improvável para o cultivo em uma paisagem reconhecida pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade.

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Mas por que o Vinho do Porto é tão especial? Ele é um vinho “fortificado” (assim como o Jerez), ou seja, durante o processo de fermentação, é adicionada uma quantidade de aguardente vínica (feita de uva), que interrompe a fermentação, retendo a parte do açúcar da fruta que ainda não foi transformada em álcool. O resultado é uma bebida equilibrada que combina a doçura natural da uva e a força do álcool. Ele se distingue dos vinhos tradicionais pela diversidade e persistência de aromas e sabores, pelo teor alcoólico mais elevado (entre 19° e 22°), pelas diferentes graduações de doçura e pela variedade de cores.

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Depois de produzido, o Vinho do Porto passa por um processo de envelhecimento, e os tipos mais comuns de vinho são:

  • Ruby – vinho elaborado com uvas tintas (o nome é uma referência à sua cor) que, mesmo envelhecendo durante dois a três anos em tonéis de madeira, ainda mantém muitas de suas características originais; encorpado e frutado, é um vinho jovem, com sabor puxando para ameixas e frutas silvestres;
  • Tawny – elaborado com as mesmas uvas do Ruby, ele também fica envelhecendo de dois a três anos em tonéis de madeira; a diferença é que, posteriormente, ele é transferido para barricas de carvalho, onde fica envelhecendo por mais alguns anos; o contato prolongado com a madeira faz com que sua cor vá clareando e adquirindo variados tons de âmbar (por isso o nome Tawny, que significa “aloirado”); tem sabor mais amadurecido e elegante, puxando para amêndoas e outras frutas secas.

Estes vinhos podem ser encontrados numa faixa de preço a partir de R$ 60, aumentando nos casos dos tipos mais sofisticados (Reserva, Colheita, Vintage, etc.). Existem ainda os Vinhos do Porto branco e rose, mas esses são menos consumidos.

Um Vinho do Porto (apenas “Porto” para os íntimos) deve ser servido numa taça de tamanho médio, tipo tulipa (evite aqueles cálices minúsculos que não permitem desfrutar todos os aromas e sabores do vinho), e a temperatura ideal é em torno de 14°C. O Porto harmoniza com diversos pratos, mas tradicionalmente é servido acompanhando queijos, como um vinho de sobremesa ou combinando com chocolates. Os Vinhos do Porto branco-seco, rose e até um Ruby podem ser servidos também como aperitivo. Mas, sem dúvida, toda a exuberância deste vinho só é conhecida quando, ao final de um jantar especial, apreciamos calmamente um maravilhoso Tawny.

O Porto também tem diversas aplicações culinárias, devido aos seus fortes sabores frutados e doçura. É, por exemplo, uma boa adição nos molhos de carnes assadas, mas é nas sobremesas que sua participação é mais marcante – experimente colocar uma dose na calda de ameixa ou de frutas vermelhas de um manjar branco. O truque é não exagerar. Ah, e um segredo de família: a Dona Flor (tia querida e cozinheira de mão cheia) põe sempre uma dose de Vinho do Porto no popular brigadeiro, o que o deixa mais aveludado.

O Vinho do Porto é a bebida perfeita para um momento romântico. Certamente alguém vai perguntar: “Mais que o Champagne?” O Champagne é uma bebida maravilhosa, que inspira festa, excitação, arrebatamento, êxtase (nada de errado com isso). Já um Porto induz tranquilidade, cumplicidade, aconchego, um gesto de carinho, uma carícia. Mas é apenas uma opinião, e se você discordar, brindemos a isso. Com um Porto, é claro.

O Porto está associado a muitas tradições, talvez por influência dos britânicos, os primeiros e ainda principais importadores da bebida (várias das atuais Caves de Vinho do Porto são de origem inglesa). Uma dessas tradições reza que a garrafa deve ser passada de mão em mão, para que cada um se sirva, sempre pela esquerda (“Port never goes to right”, isto é, “o Porto nunca vai para a direita”). A razão viria do tempo dos duelos, para que a mão direita estivesse livre no caso de um eventual ataque. Mas os portugueses preferem a versão de que o lado esquerdo é o do coração e, por isso, o Porto é servido sempre pela esquerda e tomado com a mão esquerda.

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Uma outra tradição é que o Porto é a única bebida com a qual se pode fazer o “Loyal Toast”, o brinde à Rainha da Inglaterra. Por isso é que recomendo ter sempre um bom Porto à mão, afinal, a próxima vez que baterem à porta, pode ser a Rainha Elizabeth que resolveu “dar uma passadinha lá em casa”. Ou, mais importante, pode ser simplesmente alguém que amamos.

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FERNANDO FERNANDES, economista, executivo da área de Recursos Humanos, e um mero apreciador das coisas simples da vida: uma boa comida, um bom vinho, uma boa leitura e, principalmente, as boas companhias.
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O Vinho Perfeito

Ainda considerado como um produto de luxo, e não um complemento à alimentação como em vários países europeus, assistimos um aumento gradual do consumo de vinho em nosso país, principalmente entre as classes média e alta. O brasileiro incorporou o vinho em seus programas e entender de vinho passou então a ser uma obrigação.

Chique é provar o vinho seguindo o ritual de agitá-lo, dar uma paradinha, olhar com carinho, sentir o buquet para então finalmente experimentá-lo. Após um silêncio de alguns segundos para reflexão,  momento de expectativa para os garçons,  faz-se então uma cara de quem entende do assunto e comenta-se algo, geralmente evasivo. Com um sorriso aliviado, o vinho é então servido pelo garçom.

Eu adoro este ritual mas assistir pode ser engraçado pois alguns sabem bem o que estão fazendo, outros, simplesmente seguem o fluxo!

O que está por trás deste produto tão sedutor?

Vejo o vinho como uma combinação de três indicadores:

  • Propriedades básicas do vinho: como tipo de uva, assemblagem, região produtora, teor alcoólico, modo de engarrafamento, safra, etc…
  • Fatores externos: como armazenagem, agitação, temperatura de consumo, pratos que acompanham, etc….
  • Consumidor: que tem gostos específicos, memórias gastronômicas e ligações emocionais.

Enfim, a experiência de cada garrafa depende da combinação destes indicadores, suportando o clichê “cada garrafa traz uma experiência única”, e pode ser apreciada usando os cinco sentidos, as vezes o sexto também!

E qual é o vinho perfeito? Para mim o terceiro indicador fala bem alto.

Aqui na Europa a oferta de vinhos é indescritível, além dos custos serem muito menores que no Brasil, podemos escolher vinhos maravilhosos em supermercados, vendinhas e até em lojas especializadas, encontrando ofertas de sei lá quantos países diferentes. Mas, confesso que já me vi pagando caro por um determinado Malbec Argentino… o mesmo que escolhi há 12 anos para ser servido no aniversário do meu pai. E esse vinho foi um néctar para mim, com ele revivi experiências deliciosas.

Para vinho, não existe regra, não existe certo ou errado. É gosto, é experiência, é interesse, é curiosidade, é atenção.

Eu adoro vinho, bebo diariamente. Nada boba, me adaptei fácil e rápido a este delicioso costume europeu! Consigo sentir minhas preferencias e fazer conexões entre minhas experiências. Diferencio e descarto os vinhos banais. Sinto quando um vinho não “está” bom, o que é diferente de quando ele não “é” bom.

O conhecimento veio com o tempo, com a curiosidade, com a exploração de muitas garrafas. Mas veio também o respeito: não me meto a abrir garrafas muito mais caras que meu conhecimento. Acho um desperdiço, um desrespeito!

É um pouco como arte, gosto de Picasso e evito Dalí. Os dois são bons, têm seus méritos mas não agradam a todos. Ainda bem!

TECA

TECA HUNGRIA
Viajante desde os 13 anos de idade, adora descobrir e experimentar tudo que é novo. 
Cansada da vida de executiva, pediu demissão e foi para Suíça, onde enraizou e ficou.
É apaixonada por gastronomia, vinhos e design de interiores.
Mora com um Suíço alemão que, mesmo sem querer, ensina todos os dias algo novo para ela.